Tuesday, August 29, 2006

Especial: Günter Grass e o nazismo



O prêmio Nobel de Literatura Günter Grass surpreendeu a opinião pública com revelações sobre seu envolvimento com o regime nazista quando jovem. Aos 15 anos, Grass se apresentou como voluntário à tropa de submarinos do Terceiro Reich, mas não foi recrutado. Aos 17 anos, foi enviado para Dresden como integrante da Waffen-SS, uma tropa de elite nazista à parte das Forças Armadas, e especialmente atuante no Holocausto.

Até agora, a informação oficial era de que Grass havia sido recrutado como auxiliar da artilharia antiaérea e servido posteriormente como soldado. Considerando-se que este foi destino de tantos jovens alemães na época e que Grass garante jamais ter dado um tiro, o fato em si não chega a causar muito espanto.

O que choca é o protagonista desta história ser Günter Grass, guardião da consciência histórica alemã, delator de todas as hipocrisias relativas à memória do nazismo, social-democrata engajado de verve moralizante e prêmio Nobel da literatura. O que também choca é o fato de a revelação ter sido tão tardia.

Numa entrevista publicada pelo diário Frankfurter Allgemeine Zeitung, neste sábado (12/08), Grass antecipou informações de sua autobiografia, Beim Häuten der Zwiebel (Descascando a cebola), a ser lançada em setembro. Confira, em nossa cobertura do assunto, as declarações de Grass na íntegra, sua repercussão entre intelectuais de língua alemã e o alcance de uma discussão que com certeza se tornará um marco na memória do passado nazista alemão.

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Literatos defendem Grass apesar de envolvimento com nazismo

http://www.dw-world.de/dw/article/0,2144,2135900,00.html

Ao revelar seu envolvimento com o nazismo na juventude, Günter Grass colheu algumas críticas, mas também ampla compreensão por parte do ambiente literário alemão. Leia reações de escritores e críticos às recentes confissões do Nobel de Literatura.


Martin Walser, escritor


O mais maduro de todos os contemporâneos não consegue comunicar durante 60 anos que foi recrutado pela Waffen-SS, sem ter feito nada para tal. Isso lança uma sombra arrasadora sobre nossa elaboração do passado e seu caráter normativo, seja na mentalidade ou no uso da linguagem. Através de seu comunicado superior e oportuno, Günter Grass acaba de dar uma lição neste clima de moralismo vigilante. Temos que agradecer-lhe por isso.


Walter Jens, crítico e teórico de literatura


A confissão de Grass é equilibrada, precisa e sensata. Um mestre da escrita se detém e reflete: "o que você esqueceu de relatar durante sua longa vida?". Foi isso o que ele fez e por isso merece meu respeito. Para mim, o significativo foi ele ter escolhido o momento oportuno. Antes, muita coisa teria parecido pretensiosa.


Walter Kempowski, escritor


[A confissão] chegou tarde demais. Mas, quem não tem pecados que atire a primeira pedra.


Hellmuth Karasek, crítico literário


O fato em si é uma ninharia. Um garoto de 17 anos: meu Deus, isso é totalmente compreensível. Se posteriormente Grass não tivesse se tornado o primeiro a levantar a palmatória moral...
Se tivesse confessado antes sua participação na Waffen-SS, Grass possivelmente teria arriscado o Prêmio Nobel. A Academia, que tem um faro bastante sensível, não teria concedido o prêmio a alguém que tivesse participado da Waffen-SS em sua juventude e se calado durante tanto tempo.


Joachim Fest, biógrafo de Hitler e especialista em nazismo


Não entendo como alguém pode se colocar em evidência durante 60 anos como "consciência pesada" da nação, principalmente em questões relativas ao nazismo – para vir a confessar só depois que ele mesmo estava envolvido. Desse homem, eu não compraria nem um carro usado.


Robert Menasse, escritor


Considero confiável e compreensível a justificativa de que Grass não confessou isso antes por vergonha. É algo digno de admiração: um homem de idade admitir que cometeu um erro.


Erich Loest, escritor


O que Grass disse deve ser aceito sem censuras. Ele era muito jovem e estava fora do alcance de qualquer influência que o pudesse ter detido. Eu também queria ter me apresentado à Waffen-SS, mas o diretor da minha escola me impediu. Grass só deveria nos dizer por que só escreveu sobre isso agora.


Klaus Theweleit, escritor


Isso não passa de um reclame do novo livro de um viciado em publicidade. Quando Grass fica sabendo, através de enquetes, que não são 102% dos alemães que o conhecem, logo lhe ocorre algo do gênero.


Ralph Giordano, escritor


Pior do que cometer um equívoco político é não se confrontar com ele. Em seu íntimo, Grass já fez isso há muito tempo, e agora parte para a opinião pública [com esta revelação]. Para mim, ele não perdeu em nada sua credibilidade moral – de forma alguma.


Hans Ulrich Wehler, historiador


Isso é um fracasso político. Grass buscou deliberadamente o acesso ao cotidiano político e resolveu atuar como uma espécie de preceptor Germaniae. Ele chegou a ser contra a reunificação – por causa de Auschwitz! Agora eu penso: Meu caro, onde foi parar sua sensatez política?

Postagem: André Veríssimo, Presidente, KoaH