Monday, July 16, 2007
Médicos Sem Fronteiras
Crónica do costume
José Diogo Quintela
Publico
Quando era miúdo, o meu maior medo usava bata branca. Médicos. Médicos e as suas agulhas. Médicos e as suas espátulas baixa-a-língua. As luvas de borracha. A caligrafia apalermada que me fez estar a tomar remédio contra a queda do cabelo para curar a varicela.
(O meu segundo medo também: o padeiro, que todos os dias, quando ia para a escola, vinha à porta da padaria dar-me caldos).
Mas dos médicos tinha terror. A minha mãe só me avisava que íamos ao consultório quando estávamos a chegar. Por solidariedade, achava eu, até ter ficado com o mesmo gesso durante um ano e meio e descobrir que ela se esquecia das consultas.
É por isso que estes atentados no Reino Unido provam que a maldade dos terroristas islâmicos não tem limite. É uma maldade que, em cada atentado, vai sublimando a perversão. É uma maldade ruim que aposta na destruição material e no abalo psicológico, ressuscitando irracionais medos infantis.
O meu trauma com médicos apareceu outra vez. O cagaço a estetoscópios voltou. Temo que em breve assistamos a um atentado perpetrado pelo Monstro que vivia debaixo da minha cama.O terrorismo islâmico é useiro e vezeiro neste aproveitamento das nossas neuroses colectivas. O medo de andar de avião tem outro significado desde o 11 de Setembro. Minam a nossa confiança na medicina, na aeronáutica, pilares da nossa civilização... Apetece mesmo que apareça alguém a sabotar os tapetes mágicos a esses marotos.
Continuo a achar o terrorismo inaceitável, mas António Guterres ajudou-me a compreendê-lo melhor. Esta semana, no PÚBLICO, Guterres diz que "há factores irritantes na comunidade internacional. (...) Por exemplo, a Palestina. Não é por acaso que assistimos a este desespero que conduz aos ataques suicidas na Europa". Ah! Então é isso! Eles estão "irritados". Durante imenso tempo, achei que os terroristas eram gente pouco razoável, que matava sem critério. Afinal, estão é "irritados". Claro que nem todos são tão moderados. Uns, mais impetuosos, põem bombas por "falta de pachorra" ou por "estarem maçados". Uma minoria. A maioria mata por irritação. Ainda bem que Guterres me elucidou, para não continuar a pensar que é por selvajaria. (Agora já sei de que é que o Fórum Mundial fala quando se refere a "outra globalização". É quando um médico indiano residente em Inglaterra se irrita com Israel e rebenta com um aeroporto na Escócia. Isto sim, é "alter-mundialização". Estes é que são os Médicos Sem Fronteiras.)
Percebo as críticas ao sistema de saúde britânico. É natural a preocupação com um sistema que depende de pessoas incompetentes que nem sequer sabem detonar bombas como deve ser.Faz-me pensar nos médicos portugueses que dão como aptos para o trabalho professores com cancro terminal. Não me preocupa uma eventual falta de compaixão, mas sim a falta de competência que leva médicos a acharem "aptas" pessoas um mês antes destas falecerem. Estes médicos prejudicam o ensino. Quando os miúdos se começam a habituar a um professor, ele deixa, subitamente, de estar "apto". Não admira que a educação esteja como está.
José Diogo Quintela
Publico
Quando era miúdo, o meu maior medo usava bata branca. Médicos. Médicos e as suas agulhas. Médicos e as suas espátulas baixa-a-língua. As luvas de borracha. A caligrafia apalermada que me fez estar a tomar remédio contra a queda do cabelo para curar a varicela.
(O meu segundo medo também: o padeiro, que todos os dias, quando ia para a escola, vinha à porta da padaria dar-me caldos).
Mas dos médicos tinha terror. A minha mãe só me avisava que íamos ao consultório quando estávamos a chegar. Por solidariedade, achava eu, até ter ficado com o mesmo gesso durante um ano e meio e descobrir que ela se esquecia das consultas.
É por isso que estes atentados no Reino Unido provam que a maldade dos terroristas islâmicos não tem limite. É uma maldade que, em cada atentado, vai sublimando a perversão. É uma maldade ruim que aposta na destruição material e no abalo psicológico, ressuscitando irracionais medos infantis.
O meu trauma com médicos apareceu outra vez. O cagaço a estetoscópios voltou. Temo que em breve assistamos a um atentado perpetrado pelo Monstro que vivia debaixo da minha cama.O terrorismo islâmico é useiro e vezeiro neste aproveitamento das nossas neuroses colectivas. O medo de andar de avião tem outro significado desde o 11 de Setembro. Minam a nossa confiança na medicina, na aeronáutica, pilares da nossa civilização... Apetece mesmo que apareça alguém a sabotar os tapetes mágicos a esses marotos.
Continuo a achar o terrorismo inaceitável, mas António Guterres ajudou-me a compreendê-lo melhor. Esta semana, no PÚBLICO, Guterres diz que "há factores irritantes na comunidade internacional. (...) Por exemplo, a Palestina. Não é por acaso que assistimos a este desespero que conduz aos ataques suicidas na Europa". Ah! Então é isso! Eles estão "irritados". Durante imenso tempo, achei que os terroristas eram gente pouco razoável, que matava sem critério. Afinal, estão é "irritados". Claro que nem todos são tão moderados. Uns, mais impetuosos, põem bombas por "falta de pachorra" ou por "estarem maçados". Uma minoria. A maioria mata por irritação. Ainda bem que Guterres me elucidou, para não continuar a pensar que é por selvajaria. (Agora já sei de que é que o Fórum Mundial fala quando se refere a "outra globalização". É quando um médico indiano residente em Inglaterra se irrita com Israel e rebenta com um aeroporto na Escócia. Isto sim, é "alter-mundialização". Estes é que são os Médicos Sem Fronteiras.)
Percebo as críticas ao sistema de saúde britânico. É natural a preocupação com um sistema que depende de pessoas incompetentes que nem sequer sabem detonar bombas como deve ser.Faz-me pensar nos médicos portugueses que dão como aptos para o trabalho professores com cancro terminal. Não me preocupa uma eventual falta de compaixão, mas sim a falta de competência que leva médicos a acharem "aptas" pessoas um mês antes destas falecerem. Estes médicos prejudicam o ensino. Quando os miúdos se começam a habituar a um professor, ele deixa, subitamente, de estar "apto". Não admira que a educação esteja como está.
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