Sunday, November 16, 2008

Pessoa o génio nosso POESIA E METAPOESIA

POESIA E METAPOESIA


ANAL/SE DE UM FRAGMENTO DO POEMA «TABACAR/A»


Por CARLOS FELIPE MOISÈS


11


O presente trabalho constitui um dos capítulos da tese Inédita. O Poema e as Máscaras: M/croestrutura e Macroestrutura na Poes/a de Fernando Pessoa. Com as adaptações sofridas, ganha autonomia; entretanto, uma breve nota acerca da ideia central da tese poderá ampliar-lhe a significação. Trata-se de um ensaio interpretativo, que visa a demonstrar duas hipóteses: a) «Tabacaria» é um texto priviligiado por sua configuração fechada e coesa, sintese de uma visão do mundo, condição preenchida por poucos outros poemas do autor; b) por esse motivo, concentra as principais linhas de força de toda a poesia pessoana, de tal modo que, através daquele, será possível atingir uma visão cabal desta. A tese conjuga, alternadamente, a microanálise, através da leitura exaustiva do poema «Tabacaria», verso a verso, e a macroanálise, através do exame, em toda a obra, de determinados tópicos suscitados pelo primeiro expediente. Seu objectivo é a determinação de um processo e/o modelo estruturador peculiar (descrito diacrónica e sincronicamente), que enforma tanto o referido poema- microestrutura, como o restante da poesia de Pessoa-macroestrutura. Este capitulo, ao mesmo tempo que exemplifica o modus operand/ adoptado na tese, detém-se num dos tópicos basicalres da poesia pessoana, aquele relativo à metapoesia; trata da conhecida invocação à «pequena [que] come chocolates» e da estrofe subsquente (ests. 7-8, vv. 72-86). 0 texto utll1zado, bem como para as demais citações, é o constante na Obra poét/ca, 5.ª- ed., org., lntr. e notas por Maria Aliete Galhoz, Rio, Aguilar, 1974 (OP).

C.F.M.

Berkeley, Jáneiro de 1978.


0 olhar que parte do espaço mensurável e tangivel

da «rua», contemplada das «jánelas [do] quarto», para

ir progressivamente alcançando voo na direcção do «sis­tema solar e a Via Lactea e o Indefinido», descreve um movimento recorrente, Não só no no poema «Tabacaria)», como no geral da poesia pessoana, Trata-se de um movi­mento pendular, que vincula a parte ao todo, o imanente ao transcendente, 0 fenoménico ao nouménico e assim o agir ao pensar. Voltada para a circunstancia e o imedia­tismo de «uma rua cruzada constantemente por gente», a consciência capta o apelo à acção, inerente ao espectáculo contemplado, e, na esteira de um interrogar-se que per­gunta primordialmente pelas possibilidades de ser. antes de tentar qualquer realização, deixa-se levar peto pensa­mento que a tudo questiona e que nada retém, e assim conduz sempre longe da rua, e da acção inicialmente pretendida, Arma-se, dessa forma, um esquema dilemático responsável pela trajectória que vai deixando no caminho, sucessivas vezes percorrido, a marca de uma consciência dividida entre ser e estar, ser-para-si e ser-para-os-outros, ser-algo, aqui e agora, e um hipotético pode ser sem espaço nem tempo. A cada etapa vencida, mais se evi- dencia o papel decisivo representado pelo pensamento,


162


163


no processo. 0 pensar se impõe como a plataforma única a partir da qual, e somente dai, qualquer tentativa de ser poderá ensaiar-se; no entanto, em vez de fixar a conscieência no espaço imediato da rua, e encaminhar a acção concreta e definitiva, o pensar remete sempre, a cada giro, para a dimensao rarefeita do espaço estelar, da Via Láctea e do Indefinido.

Daí advém a opressiva sensação de estar aprisionado ao pensamento e sua ambiguidade: o pensamento consti­tui, na verdade, o unico meio de conduzir a realidade imediata, mas a cada tentativa mais se afasta desse objectivo (1). Assim se explica 0 «desvio» representado pelo parêntese do trecho que temos pela frente (vv. 72-79), como tentativa de isolar-se, pôr-se a margem, para ao menos provisoriamente interromper o fumo que o pensa­menta vinha triIhando desde a afirmação capital «Não sou nada», e, desse modo, escapar ao sufocante cir­cuito fechado já inscrito naquela proposição. Por outro lado, esse provisório isolamento dentro do parêntese permite que venha à tona urn impulso visivel nos versos iniciais, aquele que pede a invocação ao «outro», a interpelação. Enquanto na segunda estrofe o poeta invoca as «janelas», colsa inanimada (numa clara hesitação de quem se recusa ao diálogo mas ao mesmo tempo se revela dese­joso dele), aqui, o ente invocado é urn ser humano, uma «pequena [que] come chocolates». Diante da invocação ás janelas, o dirigir-se a uma pequena representa urn passo a frente; náo obstante, a hesltação e a recusa persistem, em face da remota senão nula possibilidade de diálogo, como veremos. Tratemos de desvendar a atmosfera densa de conotações que se esconde no interior desse parêntese.

0 «comer chocolates» aparece, inicialmente, como

164


fazer, como acção concreta, em oposição a pensar, caracteristico da postura contemplativa do poeta. Realizada pela criança, a acção ganha o sentido do prazer e do jogo ludico, e nao o do interesse finalista: chocolate, para eIa, é guloseima e não alimento. ou seja, a acto vale, para a criança, pelo que contém em si de deleite e fruição, e não pelo que poderia representar como finalidade prática de alimento. Comer chocolates, no caso, constitui acto sem intencionalidade, sem antecedentes, e praticado sem a cogitação dos resultados ou consequências. Acto pleno, sem antes nem depois, o comer chocolates envolve o total empenho e participação do ser que a pequena é, inteira­mente entregue ao prazer da gula, submetida à atracção do chocolate, mas submetendo-o também, porque o devora. O chocolate, assim, naquele instante privilegiado, se transforma no centro do universo: tudo o mais perde a vigência e a razão de ser, ou tudo o mais converge para o acto de comer chocolates. Naquele momento, o universo inteiro se reduz ao chocolate. e nada mais conta, ou melhor, tudo conta, mais profundamente e de outro modo. O momento da «iIuminação», Satóri-Zen. seriamos incli~ nados a dizer. Qualquer coisa próxima daquiIo que Caeiro relata de seu «Menino Jesus» (os grifos sao nossos):

«Ao anoitecer bricamos as cinco pedrinha

No degrau da porta da casa,

Graves como convém a urn deus e a urn poeta, E como se cada pedra

Fosse totIo um universo

E fosse por isso urn grande perigo para ela Deixá-la cair no chão» (OP 211),

165

e assim se configura a unica forma de conceber a ple­nitude e a harmonia do existir, pela perfeita integração entre «eu» e realidade.

Mas, atentemos na forma explicita como a criança, o comer e os chocolates aparecem no poema. Ao interpelar a pequena, o poeta exclama, para em seguida reiterar a exclamação:

«Come chocolates, pequena! Come chocolates!»

Ordem? pedido? desejo? Na verdade, todos a um tempo, mas um desejo, um pedido e uma ordem que o poeta dirige mais a si próprio do que à criança, pois a ela jámais será necessário que se Ihe peça ou ordene comer choco­lates: ela sempre o fará, tão naturalmente como respira. O poeta, sim, é que se sente incapacitado para tal, e, ao invocar a pequena, ensombrecido de melancolia e descon­solo, parece estar invocando a si mesmo, na expectativa de que algo em seu ser, que não sejá o pensamento inibi­dor da acção, lhe permita comer chocolates (ou ligar-se à realidade) com aquele mesmo sentimento de prazer e plenitude que tern a criança, profundamente compene­trada do acto que pratica, sem hesitações, indiferente a tudo que a cerca e que, nesse instante, prodigiosamente se ilumina, mas não aos olbos da criança, que não estão a ver senão chocolates, talvez nem isso.

Esta pequena que come chocolates ganha, assim, uma função evidentemente simbólica no contexto do poema «Tabacaria»: representa a atitude ideal, impossível para o poeta, por ele divisada como capaz de desfazer os enig­mas e mistérios do mundo. E dessa forma ganha, também,

166


mais rico sentido a transcendente ironia do comentário seguinte, quanto a não haver «mais metafisica no mundo senão chocolates», um comentário que Álvaro de Campos dirige ainda à pequena mas que não ilude quanto a seu verdadeiro destinatário, o próprio poeta. Um comentário em que, enfim, Campos se esforça por aplicar uma das li­r;oes do «Mestre» Caeiro, aquela segundo a qual «há. me­tafisica bastante em não pensar em nada». Instigado peIa ironia de a metafisica provir, ao fim de contas, da banali­dade mais trivial, como o comer chocolates, e não da gra­vidade solene (mas esta oposição traduz, obviamente, o ponto de vista do adulto, distorcido pelo autopoliciamento, e não o da criança, para quem o acto, longe de ser «banal», se reveste da mais profunda gravidade, justamente por­que eIa o ignora) -, o poeta prossegue com um segundo comentário, ainda introduzido pelo mesmo «olha que» do anterior, e, nesse passo, a ironia devém sarcasmo, contra a artificial gravidade do adulto:

«Olha que as religioes todas não ensinam mais que a confeitaria.»

Desconcertantemente ambíguo, o verso ao mesrno tempo contrapõe e conjuga religião e confeitaria. De um lado, esta, enquanto mostruário de guloseimas e convite à fruição do instante (metafísica implicita, portanto), ensina mais que aquela, que não passaria de um report6rio de «verdades» autotélicas, montadas sobre a arbitrariedade da crença do estatuto ritualistico. De outro lado, a reli­gião é comparada à confeitaria, pela identificação da finalidade: aqueIa não ensina senão o que esta última

167

ensina, de tal modo que suas verdades e explicações não passam, também, de mostruáirio de guloseimas.

Assim, quando o texto retoma a exclamação inicial («Come, pequena sujá, come!»), 0 acréscimo do adjectivo «sujá» denuncia a intromissao do adulto, através do juizo reprovativo. A possibilidade de se sujár ao comer chocola­tes é algo a que a criança está perfeitamente alheia; somente ao adulto poderia ocorrer tal preocupação, en­quanto sintoma de um interesse voltado para além do comer chocolates, voltado para as eventuais comequên­cias do acto e, sobretudo, para as aparências, a sujeira, indicio da autocensura do «eu-social». Enquanto o adulto se inibe, desviando de si e do chocolate a atenção, para voltá-Ia aos «outros», a criança se entrega toda à tarefa de comer e se lambuzar, indiferente ao que poderá advir. Para isso, o chocolate se torna, para ela, o centro do uni­verso, um centro que a criança encontra porque não o procura, ao passo que o adulto, por o procurar com avi­dez, irremediavelmente o dispersa no tumulto de um pen­samento que impede sempre que o ser coincida com o estar. Para a criança, estar comendo chocolates contém toda a sua essent/a: para o adu1to, esta se projecta sem­pre para além do estar. Para o aduIto, na verdade, a essent/a nunca está.

Nessa utópica identificação entre ser e estar (que 1he é sugerida pela «pequena sujá»), o poeta divisa, quando não a verdade, ao menos uma verdade; não a verdade do «saber», como !he ocorrera no início do poema («Estou hoje vencido como se soubesse a verdade»), mas.a ver­dade de «ser»:


Tal espécie de verdade surge como algo inacessivel ao poeta, pelo facto de, neste, o pensamento se interpôr sem­pre entre seu próprio ser e o mundo, resultando em dis­torcer a realidade, para finalmente perdê-la:

«Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de

folha de estanho,

Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.»

Pensar, de inicio, faz que o indivfduo se prenda à.apa­rência das coisas, como o invólucro da «folha de estanho»; em seguida, a aparência é superestimada e se transforma em «papel de prata», fazendo que a atenção se desvie do essencial, que é o chocolate contido na embalagem, e se detenha nesta última, devidamente valorizada em metal nobre, para «justificar» o equívoco. Quando, finalmente, a consciência se dá conta de ter sido lograda, o essencial se perdeu, o chocolate foi deitado ao chão, como a vida, e o individuo tern nas mãos, inutil, a aparencia superficial das coisas, novamente devolvida à condição irrisória de «folha de estanho».

É por demais evidente, pois, a função simbólica repre­sentada pela pequena dos chocolates, Designemos por /nocênc/a o simbolo aí configurado, por força da associação com a imagem da criança, Mas uma inocência que não se contrapõe a «pecado», como as religiões e a Moral ensinam, porém ao pensamento, ressalvada a hip6tese de o próprio pensar ser entendido como pecado, Em suma, inocência como o poeta a designa, na linguagem concep­tual do Prlme/ro Fausto:


«Pudesse eu comer chocolates com a mesma

[verdade com que comes!»


«Não é o vicio

Nem a experiência que desflora a alma,

É só o pensamento. Há inocência

Em Nero Mesmo e em Tiberio louco

Porque há inconsciência. Só pensar

Desflora até ao intimo do ser.

Este perpétuo analisar de tudo,

Este buscar de uma nudez suprema

Raciocinada coerentemente

É que tira a inocência verdadeira.» (OP 471-472)

Pensar é, pois, perder a inocência, e a inocência seria

a única forma de se integrar no mundo e ser em pleni-

tude. Desse modo, a figura da pequena aponta, através

da associação com a infância, para o paraleIo que ine­vitavelmente se arma entre o presente do aduIto que fala

e o seu passado, o da criança que foi2. Assim, delineia~se

com inteira cIareza o carácter de mon6Iogo interior que

tern essa interpelação à pequena: é consigo. próprio que o

poeta está a falar, com aquilo que, de si é já irremedia­velmente perdido.

Por isso, salta à vista, e causa espécie, a inversão dos géneros: porque o adulto, masculino, se dirige à criança,feminina? Por que «pequena» e não «pequeno»? A res­posta tern de ser, obviamente, uma só, se quisermos evi­tar os riscas da especulação biográfica ou psiquiátrica: a forma feminina do ente invocado representa a radical

oposição entre o real do adulto e o ideal por ele almejádo,

a absoluta impossibilidade de deixar de ser aquilo que é,

para tornar-se «outro», essencialmente distinto. Numa palavra, an/mus contraposto a an/ma, indice de uma cisão interior imposslvel de ser conciliada, tal como o mari­-

170


nheiro, sonhando em masculino peIas veladoras do «drama estático», representa a oposto destas últimas; a mesma radical impossibiIidade que o Pessoa ort6nimo divisa diante da «pobre ceifeira»:

«Ah, poder ser tu sendo eu! Ter a tua alegre inconsciência E a consciência disso!» (OP 144),

de tal modo que a «pequena» de Álvaro de Campos, a

«ceifeira» do ortónimo, assim como a «Lídia» ou a «Cloe» (vagas expressi5es metaf6ricas, de existência quase irreal) em que Reis projecta seu anseio de ideal - se irmanam e se identificam para configurar um dos núcleos de toda a poesia pessoana, verdadeira imagem arquetípica, passiveI de assuinir variadas formas, sempre fem/n/nas, representativas do ser em plenitude, em harmoniosa comunhão consigo mesmo e com o universo. Em todos os casos, esse arquetipo surge como aquilo que se contrapõe a pensa mento, como aquela dimensão anímica que é Iiberada quando cessa o pensar. Daí seu componente mítico, pré-16gico, vincuIado ou à infância, ou à inconsciência dos

primitivos ou ao extâse amoroso. Entretanto, esse ingre-­

diente mitico é sempre atingido atraves do pensar, resulta de uma act/v/dade real/zada pela pensamen/o, que, por isso mesmo, nunca poderia estar ausente. Dai a perspec­tiva absurda gerada pelo processo, e o caracter ut6pico do ideal que o poeta procura alcançar, admiravelmente expresso na ambiguidade de «ter a tua alegre inconsciência e a consciência disso»3.

Círculo vicioso, beco-sem-saida, tarefa de Sísifo - a

única soIução que o poeta encontra para o impasse reside

171

na magistralmente engenhosa ficção de Alberto Caeiro, «que nunca guardou rebanhos, mas é como se os guar­dasse». Nesse heterónimo realiza~se a forma extrema desse núcleo da poesia pessoana, que atrás desig­mámos por arquétipo da inocência. Enquanto Campos, Reis e o ort6nimo temat/zam essa imagem arquetipica, projectando-a em figuras como a pequena, a ceifeira, Cloe e outras, Caeiro /ntegra-.a em s/ mesmo, reaIizando a ino­cência, não como tema, mas como ingrediente que o constitui:

«Nunca fui senão uma criança que brincava. Fui gentio como o sol e a água,

De uma religião universat que só os homens não

[têm.» (OP 236)

A persona assumida por Caeiro representa a conciliação entre an/mus e an/ma, indice de uma espécie de androgi~ nia ideal, resultando num ser que a si próprio se basta - o «outro universo» a que se refere seu discipulo Álvaro de Campos, pois tern em si o centro, O núcleo gerador de quaIquer universo possíveL Já para Campos, esse cen­tro está na pequena dos chocolates; para Reis, no amor de Lídia ou Cloe («uma Sombra»); para Pessoa /pse. no canto da ceifeira; e assim por diante. O bucolismo de Caeiro vem a ser, em suma, a efectivação de uma ima­gem arquetípica que está dispersa nos demais, exteriori-­

zada e descentralizada. Aquilo que nos outros é sonho

ut6pico, tanto menos exequível quanto mais procurado,

na ficção de Caeiro aparece como verdade directamente apreendida:

172


«Foi isto o que sem pemar nem parar,

Acertei que devia ser a verdade

Que todos andam a achar e que não acham,

E que só eu, porque e não fui achar, achei.»

(OP 227)

Numa palavra, a concepção do existir, para Caeiro, cor­responde ao modo como, na «Tabacaria», a pequena come os seus chocolates. Caeiro representa o ser impassi­vel, qualquer coisa como a inconsciência de uma ceifeira

perfeitamente consciente disso, ou uma pequena que,

enquanto os come, sabe que «não há mais metafisica senão chocolates». Por isso, Caeiro é o «Mestre» dos

demais, porque sabe que «a única inocência e não pensar»,

e sabe fingir que não pensa, lição que os discipuIos não

puderam ou não quiseram aprender.

Desse modo, além de poder ser entendido, com justa razão, como o «grau zero» da poesia pessoana»4, enquanto representação de uma forma «primitiva» de ver, ingénua e despremeditada, a partir da qual se superporiam as formas «civilizadas» dos demais heter6nimos - Caeiro deve ser também entendido como ponto de chegada, como «grau n», de vez que o arqu6tipo da inocência, nele pIas­mado, não pareee constituir um estado anterior ao pensa~

mento (como o da pequena ou o da ceifeira), mas algo

posterior a (e obtido por) esse mesmo pensamento; não uma inocenda a/nda não distorcida pelo vicio de pensar, mas, ao contnirio, a inocência atingida pelo pensar que

já não ma/s se rende a esse vício, pois foi capaz de «aprender e desaprender».

Noutras palavras, temos em Caeiro, não um modo de ser. mas um modo de ver, o que determina uma proble-­

173

mática eminentemente epistemológica. A postura repre~ sentada nesse «argonauta das sensações verdadeiras» cor­responde à tentativa de apreender a realidade, inde­pendentemente da consciência que a apreende, como se fosse possível esse cognoscere liberto das injunções do ser cognoscente. O resuitado é que os poemas de Caeiro podem ser vistos, em última instância, como longa e acurada reflexão sobre a própria linguagem, abstracta e rarefeita, a ponto de apenas se manifestar como instru­mento neutro, «transparente», que, uma vez cumprida a missão de apreender o real «em si», deve evaporar-se, a fim de que somente os objectos apareçam, inteiros e autónomos. É por demais evidente a afinidade entre essa problematica e o pensamento de WIttgenstein, até mesmo na. brevidade de linguagem e no tom aforístico que o filósofo imprime à sua reflexão:

«Se as coisas podom aparecer em estado de coisas, então isto já deve estar nelas. / É possível descrever situa­ções, impossível no entanto nomeá-las. / Posso nomear apenas objectos. Os signos os substituem. Posso apenas falar sobre eles, não posso, porém, enunciá-Ios. Uma pro­posição pode apenas dizer como uma coisa é, mas não a que é. / O que se exprime na linguagem não podemos expressar por meio dela. / O sujeito não pertence ao mundo mas é limite do mundo. / O Mundo independe da minha vontade», etc.5

Estes e váirios outros enunciados wittgensteinianos compõem com os versos de Caeiro surpreendente e har­moniosa unidade, como se estivessem a se comentar e a se desdobrar mutuamente. Tanto ao poeta quanto ao fil6­sofo é comum a desconcertante ideia de que toda essa longa enumeração de «verdades» axiomáticas não passa

174


de tentativas falhadas de aproximação gradativa da reali­dade, apenas palavras, frases, desprovidas de subsistência, mera arquitectura 1ógica e artificial cuja finalidade é vir a ser abandonada, para que só os objectos permaneçam: «É preciso por assim dizer jogar fora a escada depois de ter subido por ela. Deve-se vencer essas proposições para ver o mundo correctamente. O que não se pode falar, deve-se calar.» 6

Caeiro constitui, quanto àquilo que designamos por

arquétipo da inocência, um núcleo que irradia energia

para toda a obra pessoana, mas também um ponto para

o qual convergem as formas parciais ali disseminadas,

assumindo naquela «paz da Natureza sem gente» sua manifestação suprema, porque mais abstracta. (Desse

modo reproduz-se, em Caeiro, quanto a este problema

particular, o mesmo jogo dialéctico, que vimos propondo, entre o poema «Tabacaria» e a problemática geral da poe­sia. de Pessoa.) Por outro lado, a oposição entre a persona de Caeiro e os demais heterónimos corresponde, noutra configuração, ao impasse entre «ser» e «estar», ou «ser­-para-si» e «ser-para~os-outros», no sentido de que Caeiro simboliza um poder-ser em plenitude, que é ao mesmo tempo anterior (enquanto pre-logos, mito de primitivismo) e posterior (enquanto ideal hipotético, intelectuaImente

concebido) as inúmeras tentativas de «ser» isto ou aquilo,

ou seja as realizações individualizadas de cada heteró­nimo, ou as tentativas referidas por Álvaro de Campos, em particular, como vemos na «Tabacaria».

Por isso, logo após o breve intervalo do parêntese em que invoca a pequena dos chocolates, o poeta retoma a peregrinação anterior, relativa ao devir, a ser e a poder-ser: «Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei ...»

175

A adversativa que introduz esta estrofe vincula-se ao verso imediatamente anterior, ainda dentro do parentese, mas vincula-se também a vários outros passos do poema, aqui retomados conjuntamente:

«não sou nada

estou hoje vencido

falhei em tudo

não creio em mim

deito tudo para o chão

MAS ao menos fica ...»


sibilinamente se refere Heidegger), a fim de que o pensa­mento se mantenha firmemente preso a seu núcleo essen- cial e possa prosseguir a partir das perspectivas abertas por esse mesmo núcleo, sempre retomado e sempre reno- vado. Como consequência (ou causa?), aflora na presente estrofe a poesia da poesia:

«Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei A caligrafia rápida destes versos,

Pórtico partido para o Impossível


O procedimento põe à. mostra o regime de circularidade que comanda a estruturação do poema e aponta para a natureza essencialmente metafisica do discurso pessoano, ao menos pela característica do «etemo retorno ao mesmo», de que fala Heidegger: «Cada pensador pensa sornente um único pensamento e só tern necessidade de um ínico pensamento. A dificuldade, para o pensador, consiste em manter a todo custo a densidade desse pensa­mento, como o único que ele há~de pensar; e há~de pen­sar este único como o Mesmo, e há-de falar deste Mesmo da maneira correspondente. Mas só falamos do Mesmo da maneira correspondente quando, do Mesmo, dizemos sempre o mesmo, e de tal modo que nós próprios seja­mos atingidos pela patavra que o Mesmo nos dirige. É assim que o ilimitado do Mesmo constitui o limite mais definido para o penar.»7 Assim, a retomada conjunta, acima referida. representa um ponto de convergência em que todo o percurso anterior é reavaliado: tudo aquilo que foi já mais de uma vez pensado será novamente pensado e repensado (o carácter ilimitado desse Mesmo a que


0 poeta refere os «versos» - a realidade concreta do poema, portanto, e não a categoria abstracta da poesia. E fá-Io de modo nada grave ou solene, «caligrafia rápida», atribuindo ao poema a condição da pressa e do improviso, de trabaIho manual, como mero registo de formas sobre o papel, e sobretudo como resíduo, pois o poema é aquilo que «fica da amargura» do que o poeta nunca será. Uma referência depreciativa, minimizada, especialmente por­que articula dois niveis distintos de realidade: aqui, o espaço efectivo de um «eu» que caligrafa seus versos; alérn, o espaço virtual de um «eu» que tern em si «todos os sonhos do mundo» e sabe que nunca os realizará. E este segundo espaço, por todos os títulos, é posto em evi­-

dente suprernacia em relação ao prirneiro. Entretanto,

embora sejam considerados como ponto de chegada, fe­chamento residual de uma virtualidade que jamais che­gará a realizar-se, os versos constituem também um ponto de partida, uma abertura que vai reconduzir, ciclica­mente, àquela origem de que provieram, «todos os sonhos

do mundo». Embora «caligrafia rapida», embora resídua,

embora comprovação de imenso malogro - os versos são


176


também um «Pórtico partido para o Impossíve!». A sole­nidade desse «Pórtico» e do «Impossível», reforçada pelas maiusculas, é nitida retomada daqueles largos voos cós­micos disseminados nos passos anteriores: «todos os sonhos do mundoo», «Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada», «cantiga do Infinito», (sis­tema solar e a Via Láctea e o Indefinido» - e evidência que, por trás da singela aparência dos versos apressada­mente caligrafados, por trás da formalidade extriíseca, o poema esconde uma dimensão mais ampIa e significativa, que remete exactamente para o largo feixe de inquietações que o poeta vem tentando fixar, desde a momento inicial: «Não sou nada».

Estamos outra vez diante da circularidade: tendo che- gado a certeza do malogro, tudo se reinicia, incansavel­mente, mas agora o processo acaba por envolver o próprio acto poético e a poesia, que passam a fazer parte integrante de uma Weltanschaulmg em vias de se formular. Desde o principio, o poema vinha configurando uma pro­blemática restrita ao âmbito existencial: ser ou estar, ser isto ou aquilo, realizar-se ou falhar, ter ou não ter aspi­rações a Cristo, Kant ou Napoleão. Quando o poema em si é pela primeira vez referido («caligrafia rápida destes versos»), a poesia aparece como algo banido desse âmbito existencial: é aquilo que fica, aquilo que sobra, o resto. Assim, a poesia designa um âmbito à parte do primeiro. No verso seguintc, porém, o poema será referido como «Pórtico partido para o Impossivel», abrindo a possibili­dade de ser desfeito o div6rcio entre esses dois âmbitos: assim como resultou do existencial, o poético vai reconduzir a este, integrando-os.

178


E o poema prossegue, dizendo:

«Mas ao menos consagro a mim mesmo um des-

[prezo sem lágrimas,

Nobre ao menos no gesto largo com que atiro

A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso

[das coisas,

E fico em casa sem camisa --.»

e esta segunda adversativa, ao mesmo tempo que também exerce a função de retomada conjunta, idêntica à anterior, prolonga e estende o processo de integração entre o existencial e o poético, atribuindo a este último a missão do «desnudamento», isto é, o encontro da autenticidade («fico em casa sem camisa»). A minimização da caligrafia rápida é, então, perfeitamente compensada pela altivez e o orgulho do «consagrar» e da «nobreza [de] gesto largo», e sobretudo pela ideia capital do encontro da pró­pria essência, liberta das aparências, o que coincide com a tomada de consciência do acto poético. «Atiro a roupa suja que sou» equivale a: desfaço-me das aparências, desfaço-me daquilo que me envolve, aquilo que, em mim, não passa de concessão ao mundo exterior. Por isso, a altivez e o orgulho se impregnam de angústia, no «gesto largo» com que o poeta abdica da exterioridade para entrar na posse de sua essência mais recôndita. Mas essa angústia não se confunde com a simples e empequenece­dora depressão advinda do malogro; não é, na verdade, um gesto de angústia mas um gesto que revela a angústia latente, permitindo que esta afIore. Trata-se, em suma, daquela angústia radical, Angst. assim descrita por Heidegger:

179



«A angústia está quase repremida no Dasein. A angús­tia aí está, adormecida. Seu hálito palpita sem cessar, através da existência. Quando menos, para o medroso; imperceptivel no 'sim, sim' e 'não, não' do homem apres­sado; mais ainda para quem é dono de si mesmo; com toda a certeza, para o radicalmente temerário. Mas esta última situação s6 se produz quando existe algo a que oferecer a vida, com o fim de assegurar ao Dasein a suprema grandeza. A angústia do temeráirio não to­lera ser contraposta à alegria, e muito menos à apra­zivel satisfação dos afazeres tranquilos. Encontra­-se, para além de tais contraposições, em secreta aliança com "a serenidade e a doçura da vontade criadora,»8 Deste modo, assumida explicitamente a condição de poeta, a angústia sobrevém, e com ela a altivez e o orgulho advindos da posse de si mesmo e a abdicação do mais. Conquanto esse abdicar de «viver» em favor de «criar» possa eventualmente manifestar-se como frustração e revolta9, isto constitui excepção, pois, no geral, o facto é aceite por Pessoa com a serenidade que resulta da plena afirmação da vontade criadora, como atestam as celebres «Palavras de Pórtico» (O mesmo vocábulo solene utilizado na «Tabacaria»):

«Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa: Na­vegar é preciso; viver não é preciso. Quero para mim o espirito [d]esta frase, transformada a forma para a casar com o que sou: Viver não é necessario; o que é necessárrio é criar: Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso. S6 quero torná-Ia grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a [minha alma] a lenha desse fogo.» (OP 15)

É igualmente de serenidade e altivez o gesto corn que

180


Álvaro de Campos declara: «Atiro a roupa suja que sou, sem rol, para o decurso das coisas», abdicando de si, enquanto ente-no-mundo, para apenas criar, solitário, o peito nu. Por outro lado, é sobremodo significativa, neste passo, a retomada do mesmo adjectivo «suja», antes atri- buido à criança dos chocolates, o que faz por irmamá-los. A roupa «suja» atirada «sem ro1» designa a intenção de um desfazer.se em definitivo, sem expectativa de retorno, pais foi lançada «para o decurso das coisas», isto é, para a finitude e precariedade do existir circunstancial, como o da «rua cruzada constantemente por gente». E aquilo que resta, o «eu» desnudado, deverá permanecer assim, em estado de essância liberta, definitivamente, porque fixado nos versos. Ora, aquilo que no poeta pode fazer frente a essa precariedade, aquilo capaz de transcender as aparências para que a essência se manifeste, plena e integra, é justamente a poesia: ali, no poema, a consciência se desnuda e se vê finalmente livre de hesitações e tibie- zas; ali, sobre o papel em branco, este ente poeta alcança, por fim, ser o que essencialmente é.

Esse «eu» desnudado, pleno e essencial, na posse de sua intransferiveI ipseidade; esse «eu» que, como animal ferido por qualquer injustiça cósmica, afirma com brio e orgulho sua subjectividade triunfante; esse «eu» terá de ser forçosamente vinculado ao arquétipo da inocência, antes examinado. Em primeiro lugar, pela identificação entre o poeta e a pequena, através do adjectivo «suja.»; em segundo lugar, pela contiguidade dos dois momentos, o da invocação à criança e o da referência aos versos: esta sucede áquela, como se fosse preparada ou desencadeada pela primeira; finalmente, pela inevitável afinidade entre fazer vir à tona o «eu» autêntico e a ideia de rea-­

181


lização plena e harmoniosa, que vimos quanto ao arqué­tipo da inocência. Numa palavra, a consciência que dolo- rosamente se indaga, desde o verso inicial, angustiada em face dos próprios inevitáveis malogros, atónita diante do largo espectro de relativismos que descortina no mundo fora, assim como em sua pr6pria inconstãncia de propó­sitos, o que a faz cada vez mais céptica e descrente - essa consciência encontra na poesia a sua verdade, não a ver­dade absoluta, sonho utópico, mas a verdade parcial e relativa de um ser que se afirma, na própria experiência do acto poético, acto revelador. que traz este ser a tona de si mesrno e, ao fazê-lo, integra no espaço privilegiado do poema toda a desagregadora dispersividade de seu estar-no-mundo.

Estamos, pois, numa encruzilhada no largo caminho percorrido, até aqui, pelo poema «Tabacaria». O arqué- tipo da inocência e a determinação do poético como cate­goria da essencialidade representam o encontro de um núcleo de sustentação, que vinha sendo perseguido desde o verso inicial, e, por isso mesmo, constitui uma espécie de ápice parcia1, síntese e fecho provisórios, em relação ás perspectivas até aí estabelecidas. Com uma breve reflexão em torno do papel decisivo desempenhado pela memória, nesse núcleo de sustentação, podemos dar por encerrada esta análise. Embora não lhe tenhamos feito uma só referência, até o momento, a memória é presença implicita no quadro que acabamos de erguer em relação à poesia e à poética pessoanas. Não pelo facto de a invo­cação à pequena subentender um indirecto retorno ao passado e a propria infância, com o leque de recordações e lembranças aí contidas; não também por se ir deli­neando, ao longo do poema, um procedimento retrospec-­


r


tivo em que o «fui» constitui presença constante em rela­ção ao «sou». Não apenas por isso, pois não estamos designando por memória somente aquela «faculdade registada pela psicologia, de conservar na imaginação as coisas passadas. A memória pensa o já pensado e por isso é a concentração do pensar sobre o que deve ser pensado, sob todas as formas e a partir de um princípio seguro. Memória é a reunião da relembrança. Ela oculta em si (e, por sua vez, também se oculta em) aquilo que, em cada caso, e acima de tudo, se há-de pensar; ou seja, aquilo que é, e pode ser atribuído legitimamente como o que é: aquilo que segue sendo. E a recordação do que se há-de pensar e a fonte primordial da poesia. Por isso a poesia é o riacho que periódicamente retrocede até o rnanancial, até o pensar como relembrança»10.

Queremos com isto dizer que, no trecho recém-ana­Iisado, o poeta alcança explicitar aquilo que estava latente desde o início do poema («Não sou nada», a propósição de abertura, deixa nos versos subsequentes um eco que se prolonga, como ineludível contracanto: «Sou poeta»), e que anda disperso por toda a sua poesia: a determinação da atitude poética, fundada na memória e orientada pelo «pensar como relembrança», no dizer de Heidegger, como única forma de congregar a dispersividade do existir e concentrar a multiplicidade do ser, sob a instauração mais densa e duradoura da fala e da palavra poética. «A poesia é a instauração pela palavra e na palavra. E que é instaurado pela poesia? O permanente. Mas, pode ser instaurado aquilo que é permanente? Permanente não é a desde sempre existente? Não, precisamente o que permanece e que deve ser detido contra a corrente; o simples deve ser extraído do com-­


182


183

plicado; a medida deve antepor-se ao desmedido.»11 E é justamente este o sentido que divisamos nos versos finais do fragmento analisado. O ser que «atira a roupa suja que é, sem rol, para o decurso das coisas e fica em casa sem camisa» é o ser que, graças ao poder instaurador da palavra poética, alcança reunir-se consigo mesmo, detido contra a corrente finita e precária do estar-no-mundo, assumindo sua própria essência, fundada na memória e no pensamento como relembrança. Ali, no espaço apa­rentemente frágil e fugaz do poema, entregue às pala­vras, que se via encadeando até pelo contágio lúdico da imponderável musicalidade, o poeta a1cança assumir-se e, de certo modo, resgatar tudo quanta de perda e malogro descortina em sua traject6ria de ente perdido entre as circunstâncias:

«Meus versos são meu sonho dado. Quero viver, não sei viver,

Por isso, anónimo e encantado. Canto para me pertencer.» (OP 526)

«Quanta vez desprezei

O lar que sempre amei

Quanta vez rejeitando

O que quisera ter,

Fiz dos versos um brando Refúgio de não serl» (OP 539)

Temos, assim, equacionado um dos núcleos problemá­ticos, não só do poema «Tabacaria», porém de toda a poesia pessoana. Mas estamos ainda em meio ao caminho que haveríamos de percorrer, para tentar desvendar na

184


íntegra essa problemática. Longe de n6s, pois, a preten­são de haver esgotado sequer esse núcleo, relativo à essencialidade do poético; somente a sequência da análise poderia ir ampliando e corrigindo o quadro aqui esboçado.

NOTAS:

1 Álvaro de Campos: «Cárcere de pensar. Não há libertação de ti?»; 35 Sonnets: «How can I think, or edge my thoughts to action ...?»; «Like a fierce beast self-penned In a bait-lair, / My will to act blinds with excess my action, / Not-acting coils the thought with regard despair, / And acting rage doth paint des­pair distraction»; etc.

2 Noutro poema, Álvaro de Campos dirá: «Comprem choco­lates á criança a quem sucedi por erro». (OP 382).

3 Tal perspectiva é retomada no Pr/me/ro Fausto: «Só a inocência e a ignorância são / Felizes, mas não o sabem. São-no ou não?» (OP 465), e igualmente ecoa nos Engl/sh Poems: «Alas! All this is useless, for joy's in / Enjoying, not in thinking of en­joying.». (OP 594).

4 Cf. Jose Augusto Seabra, «Caeiro ou o grau zero da poe­sai». in Fernando Pessoa ou o Poetodrama, São Paulo, Perspectiva. 1974, pp. 89-107.

5 Ludwig Wittgentein, Tractatus Log/co-Ph/losaph/cus, trad. bras., São Paulo, Nacional/EDUSP, 1968, p. 56, 63, 78, 111 e 125.

6 Id., ibid., p. 129.

7 Martin Heidegger, «Qué s/gn/f/ca pensar?» trad. arg:..B. Aires, Nova, 1958, p. 51-52.

8 Idem, «Que es metafs/ca? trad. arg.. B. Aires, Septimu., 1956. p. 30.

9 «When I do think my meanest line shall be / More in Time's use than my creating whole, / That future eyes more

185


clearly shall feel me / In this inked page than in my direct soul; / ... An anger at the essence of the world, / That makes this thus, or thinkable this-wise, / Takes my soul by the throat and makes it hurled / In nightly horrors of despaired surmise.» (OP 589-590).

10 M. Heidegger, «Que s/gn/f/ca pensar?», ed. cit., pp. 16-17. II Id., «Holderlin y la essencia de la poesia», /n Arte y Poes/a, trad. mex., México, FCE, 1968, p. 106.