Saturday, December 29, 2007

מכתב תודה


"...מה שרציתי בעצם, זה להודות לך מכל הלב על כל הזמן שהקדשת לי, על החום והתמיכה האינסופית, על הגב הזה שמה שלא יהיה יש למי לפנות ויש מי שידריך... על זה שחזרה לי התחושה, המון בזכותך, שיש לי אותי והכל יהיה בסדר, שנזכרתי בכלל מי אני וכמה מצוינת ונחמדה אני יכולה להיות...
העולם חזר לחייך אליי למרות הקשיים והמכשולים, ב"אני הפנימי" שלי הכל בשליטה והכל עוד ישתפר.
אני יודעת שמה שעשית עבורי הוא הרבה מעבר לאימון ואני מעריכה ואוהבת אותך על זה עד בלי די, אני בהחלט יכולה להגיד היום שעל אף שרק התחלתי בתהליך האימון השיפור ניכר מאוד, במיוחד בתחושה הטובה ובחיבור במחודש שלי עם עצמי. אני מרגישה שעוד לא מיציתי את היריעה הרחבה הזו שהאימון יכול לפתוח בפני...
בכל מקרה רציתי לומר שוב תודה, אי אפשר להעביר בכלל במילים את התודה שאני מוקירה לך ומאחלת לך את כל הטוב שהיקום יכול להציע לך... אוהבת מאוד"
האם אפשר למצוא איזון בין קריירה לחיי משפחה וזוגיות? האם ביטחון עצמי הוא דבר שנולדים איתו או שניתן להתאמן ולרכוש אותו, האם בגילי המופלג אוכל לעשות שינויים דרסטיים במערכות יחסים שאני מנהל/ת? והאם יש דרך למצוא כוחות ותעצומות נפש על מנת שנוכל לעזור לעצמנו תהיה אשר תהיה הדילמה שלנו...?
אימון אישי הינו דלת שונה ומיוחדת לאיכות חיים גבוהה יותר. אני מאמנת לתקשורת טובה יותר עם הסובבים אותנו אך בעיקר עם עצמנו ,על פי ניסיוני זוהי דרך להתקרב אל התוצאות להן אנו מייחלים.
לחיות זו התרגשות וזה קושי, זו אהבה ולעיתים כעס, זה עליות ומורדות – אך מפעם לפעם זה לבכות מרוב אושר.
יש מה לעשות, יש פתרונות לחלק מהקשיים בעיקר יש מי שיקשיב לכם.
אימון זו דרך חיים שלא חוסכת מאיתנו התנסויות ולא מונעת אותנו מליפול כי אם מאמנת אותנו לחיות למרות, ליד ולצד הקשיים ועדיין למצוא את חדוות החיים, את השמחה והאור , את הרגישות והצחוק.
זה הזמן להרים את הטלפון לקביעת פגישת הכירות ללא עלות






לקבלת הצעה לפרסום באמצעות דיוור אלקטרוני בתפוצה ארצית :
הקלק כאן


להסרה מרשימת התפוצה לחצו על המעטפה
דיוור זה הינו ערוץ שיווקי לגיטימי וחוקי , במידה והפרענו , סליחה

António Tabucchi: a voz da escrita

Andre-Moshe Pereira

Pres. Comunidade Judia Or Ahayim



Existe um conflito entre a cultura oral e a cultura escrita em Tristano Morre. De António Tabucchi, (AT), P.D. Quixote, Lisboa, 2006. A cultura grega é a origem da palavra oral. A palavra supõe o registo, o depósito da memória, a escrita. A escrita reinventa e reconstrói os acontecimentos como a escrita. O estatuto da voz pode ser maior que o estatuto da escrita. O escritor está ao lado do moribundo e limita-se a ouvir e a reescrever, como o leitor e o seu papel é apenas simbólico. O papel nesse plano é importante como elemento químico dum passado cada vez mais passado.

A voz é biológica e a escrita mineral. Vivendo, respirando, emitindo um som expomos uma forma de vida. A tinta é um produto artificial; graças ao corpo biológico falamos e somos animais que representam a vontade e definem a identidade do que vamos sendo. Como pode num livro o estatuto da voz ser maior que a escrita? Há ouvintes imaginários em cada um de nós, ouvimos e reescrevemos. Somos mais o ouvinte que o falante; invariavelmente o escritor é a voz e o ouvido; ter que ser como revela a Carlos V. Marques o mesmo António Tabucchi “a bofetada e a cara”. Como entender a escrita… dum acto que vem da voz e da fala e não do papel? O importante é que quem escreve cria a personagem; como o nacionalismo cria a Nação; o heroísmo é um heroísmo visceral; um enviado de Mussolini a violar um País (a Grécia): um alemão que mata uma criança e uma velha: instintivamente o italiano seu aliado institucional – derivado do pacto ou aliança – mata o alemão. Faz a traição ao seu país mata o seu aliado: mesmo nas pequeníssimas traições há qualquer coisa que fica a moer-nos por dentro, refere o Autor. Entrará na resistência grega e depois entrará na italiana. Deriva política: a parte emotiva tem uma importância decisional nas nossas escolhas. Não se pode determinar o que é emocional e racional na predeterminação nos nossos actos: a alquimia que nos leva escolher o que estamos a acertar e a errar; cultura, educação e convivência social: a parte racional; Se um miúdo apanha um pontapé de um adulto… o que poderíamos fazer? O impulso ou a razão; a idade é a altura da sagesse: Cícero em De Senectute: aos setenta anos: a idade da sabedoria: Immanuel Kant: diria antes: “meu caro Cícero para que lhe serviu chegar aos oitenta anos, da razão depois de cometer tantos erros?”.

Poderíamos perguntar-nos como funciona a parte social da nossa razão emocional: Norberto Bobbio foi um grande estudioso do legado de Thomas Hobbes. Estuda ele o modelo hobbesiano, estado de natureza conflitual da sociedade civil. Aqui entra pela porta pequena Thomas Hobbes. Na linha do pacifismo, Bobbio utiliza o legado de Hobbes na relação que realiza entre o estado moderno e as condições para a paz perpétua. Norberto Bobbio Entre outros autores sobre os quais também estudou e publicou como Gramsci (Ensaios sobre Gramsci e o conceito de sociedade civil), Locke (Locke e o direito natural), Hegel (Estudos sobre Hegel: direito, sociedade civil e Estado), Kant (Direito e Estado no pensamento de Immanuel Kant) e outros.

Sobre a influência de Hobbes na sua obra, Bobbio comentou em Reflexões de um octogenário: “[...] reconheço. Hobbes foi um dos meus principais autores. Sobre ele me debrucei de tempos em tempos durante toda a minha vida” (Bobbio, 1997, p. 117). Disse ainda que não se havia dado conta de que o Leviatã não era o Estado totalitário, “mas o Estado moderno, o grande Estado territorial moderno, que nascera das cinzas da sociedade medieval; um corpo político capaz de actuar historicamente nas mais diversas formas de governo” e que o “Leviatã é substancialmente o detentor do monopólio da força legítima: legítima porque fundamentada no consenso dos cidadãos”. E prossegue, “Fiquei impressionado sobretudo pela inovação de Hobbes em relação ao método. O discurso de Hobbes já não se fundamentava no princípio da autoridade, histórica ou revelada, [...] mas em argumentos exclusivamente racionais” (ibid., p. 117-118). O alcance de Hobbes foi maior em relação ao método que ao conteúdo. De qualquer forma, também em relação à substância existem ideias hobbesianas que contribuíram para a formação de seu pensamento político, como ele mesmo enumera: o individualismo, o contratualismo e a ideia da paz através da constituição de um poder comum... (Bobbio, Escritos autobiográficos: De senectute e outros escritos autobiográficos. Rio de Janeiro: Campus, 1997, p. 118). O que chamamos de modelo hobbesiano é a concepção de estado de natureza como estado de guerra permanente, “no qual os homens eram todos iguais no poder de infligir-se reciprocamente o maior dos males: a morte” (Bobbio, O problema da guerra e as vias da paz. São Paulo: Unesp, 2003. (Em geral ,Vd. Gustavo O. Vieira, Civitas – Revista de Ciências Sociais, Porto Alegre v. 5. n. 2, jul.-dez. 2005).

O que faz o Autor continuar a voltar? A fidelidade às amizades…O hábito faz parte na vida. Este Portugal que entrou prepotentemente na vida de Tabucchi através da língua. A pátria é também a minha língua refere Tabucchi; ter um País ou dois é um privilégio: a língua é uma coisa muito profunda, um depósito de memórias do nosso imaginário, do nosso vivido. Os ambientes influenciam a escrita. Os livros têm calor, Verão, o calor de Requiem, de Afirma Pereira, meteorologicamente há marcas, essa marca portuguesa, na expressão popular.

No território neutral em Paris que foi escrito o Requiem; Paris a última fronteira, 1964: em trânsito; Fillologia Românica Língua e Literatura Portuguesa: o melhor estudante de português. Esse acaso que dá de seu nome Tabacaria de Fernando Pessoa; a primeira Palavra – Oh Pá! Paz, Rapaz, como Che! Na Argentina… fala primeira desse contacto longínquo, o francês.

A aprendizagem da língua: aprendem-se bem as línguas com o método Berlitz: língua a língua, boca-a-boca. Essa epifania: num comboio ler esse poema e depois deixar-se levar pela intensidade pessoana. Depois de filosofia e desses estudos inúteis (de filosofia) na Sorbonne regressa à Toscana; Pisa e chega à conclusão que era melhor estudar Letras. O primeiro contacto com Portugal: 1965: Portugal intelectual que estava reduzido a intelectuais, escritores e artistas que viviam com certa dificuldade: José Cardoso Pires, Alexandre O’Neill; amizades e cumplicidades: o livro abre uma porta, induz a visitar para se ficar num País são precisas as pessoas. A modernidade que vivemos é a arma de dois gumes e felizmente nos afasta do saudosismo e do ruralismo secreto. Portugal mudou rapidamente, caoticamente, vertiginosamente; este é um país um país democrático esta modernidade excessiva que não arrase a humanidade que devemos continuar a manter. Depois vem a solidão das grandes cidades do mundo e vêm os conflitos e hostilidade: é preciso guardar a humanidade, o humanismo. O liberalismo déchaîné que cria uma sociedade com grandes conflitos tensões e hostilidade. O livro dito ou ditado: O livro Tristano Morre fala é um solilóquio; a narrativa como descrição: a voz terceira: a voz de quem morre: a corrigir as interpretações biográficas. A rasura da própria história. A morfina que este moribundo consome propõe uma intersecção alucinante entre a lucidez de sonhos e delírios. Da vida é muito mais o que não recordamos do que o que recordamos. Qual o sentido da vida?

As notas de cadernos como os de Wittgenstein antigos e preciosíssimos. O livro oral de Tabucchi (António Tabucchi é uma das vozes mais representativas da literatura europeia. Autor de romances, contos, ensaios, reportagens, peças de teatro, os seus livros estão traduzidos nas mais diversas línguas entre as quais se contam o japonês, o finlandês, o chinês, o curdo, o hebraico): a escrita impõe e determina a literatura e literatice. Valentina Parlatto por momentos foi o outro de si. Ele fala, ela escreve. Estava a ler o manuscrito e recodifica o que estava escrito e há uma diferença que a fillologia não detecta e que a exegese futura terá dificuldade em consagrar. O escrito é o outro – esta fase é forte. Mês e meio para uma escritora que surge como uma dádiva que surge pela voz de um deus menor, o autor, AT. A reconstrução da vida é impossível. Um homem que fala incessantemente para outro em nome de outro, para outra. Que método é este? A voz dum moribundo que se conta através dum estilo que inaugura a biologia da escrita. A novidade: construir o livro na cabeça. Decorar o que está na cabeça e sai para o papel. Uma escrita telemática. Em substância dum conto. A canção sefardie . o homem enamorado do ar: as perseguições de nós, outros, dos judeus na Península no início do Século XVI, no Jardim Botânico e no Príncipe Real, algo do seu passado, uma marca muito grande que é Auschwitz: um terraço uma rapariga, que estende a roupa a secar no terraço de cima do prédio e sai daí Samuel, Shmuel, e giram os dois nos braços um do outro como se fossem um e ela começa a cantar a canção que ele conhecia de que ele se lembra…o que testemunhava este acontecimento. Lembra, creio, um quadro de Marc Chagall no rodopio infinito para o alto. As promessas não são promessas, na modernidade; não têm nenhum senso de parentesco ou amizade.


Thursday, December 27, 2007

Parshas Shmos

Rabino Yissocher Frand

Dedicated in memory of Yosef Yochanan ben Yehoshua, by Aharon Tzvi ben Yehoshua Krausman



These divrei Torah were adapted from the hashkafa portion of Rabbi
Yissocher Frand's Commuter Chavrusah Tapes on the weekly portion: Tape
#576 – Davening With Shoes. Good Shabbos!


They're here! Commuter's Chavrusa Sh'mos Series 20 on tape or CD, toenlighten, inspire and perhaps amuse you with such fascinating topics as:"Davening Out Loud - A Good Idea?", "The Neighbor Who Forgot To Turn OffThe Fire", "Shul Winows: An Open or Closed Case?"



The True Reward For The Midwives


In the first chapter of Shmos, we learn about Pharaoh commanding the Jewish midwives, Shifra and Puah, to kill all newborn Hebrew boys -- and that they disobeyed the King's orders. Chazal [Our Sages] teach that not only did they disobey the orders and not kill the babies but "they caused the boys to live." Even if they found a sickly child, they provided him with water and sustenance and helped nurse him back to health.

Pharaoh chastised the midwives. They offered excuses for their disobedience. Then the Torah says: "G-d benefited the midwives -– and the people increased and became very strong -- and it was because the midwives feared G-d that He made them houses." [Shmos 1:20-21] (Our Sages say this means they were the matriarchs of houses of monarchy and priesthood.)

There is an obvious difficulty in the narration of G-d's reward to the midwives. The phrase "and the people increased and became very strong" seems totally out of place in these verses [pas ukim]. It appears to interrupt the description of the reward with which "G-d benefited the midwives."

Rav Mordechai Kamenetsky cites an interesting observation in the name of Rav Elya Svei that explains the sequence of the verses. Reb Elya bases his observation on a personal anecdote. A relative of Reb Elya's had a premature child. The baby was in the hospital for a couple of months and came home after several weeks of intensive care in the hospital. The parents were very grateful to the doctors and especially to the nurses in the neo-natal unit. The father of the baby called Reb Elya and asked him how he could show his appreciation to the staff in the hospital.

Reb Elya advised the following: Every year on the child's birthday, he should take the child back to the neo-natal unit and show the nurses and the doctors how much he has grown. "See the actions of your hands. Look who you allowed to live and to grow up."

The greatest reward for the people worki ng in that unit is seeing that their efforts paid off, that their labors resulted in a very significant accomplishment.

Reb Elya said that the same interpretation should be read in these pasukim: "G-d rewarded the midwives." What did He do? "The people became many and very mighty." The greatest reward for the midwives was that Klal Yisrael grew. Pharaoh wanted to kill off all the Jews and destroy the possibility of a future Jewish nation. The "houses" that G-d made for Shifra and Puah were only the peripheral reward. Their main reward was seeing the fruits of their labor: Pharaoh's decree failed. Their work to save the Jewish people succeeded. The people became many and very mighty!



One Mitzvah Leads To Another

In the second chapter of Shmos, we read the sequence of events whereby Moshe must flee Egypt. One day, Moshe saw an Egyptian beating a Jew, and he killed the Egyptian. The next day, he became aware that his action was discovered and he had to flee for his life. [Shmos 2:12-15]

Moshe fled to Midian. He met the seven daughters of the priest of Midian by the well when they were trying to water their father's sheep. Moshe saw the local shepherds come and drive away the seven daughters. Moshe saved them and watered their sheep. They returned to their father who was surprised to see them home so early that day. They explained, "An Egyptian man saved us from the shepherds..." [Shmos 2:16-19].

The simple reading of this comment of Yisro's daughters is that they perceived Moshe to be an Egyptian, and this is how they described him to their father.

There is a Medrash on this pasuk that gives another interpretation. We have cited this Medrash on previo us occasions. This year, however, we will give a new insight into this Medrash based on the teaching of Rav Meir Bergman.

The Medrash incredulously asks, "Would Moshe identify himself as an Egyptian?" Rather, Moshe explained to the daughters of Yisro that they were saved by an Egyptian man –- namely the Egyptian who was beating up on the Jew who Moshe killed. Had that Egyptian not started the chain reaction of events that caused Moshe to flee Egypt and arrive in Midian, they would have never been rescued by Moshe from the shepherds.

The Medrash supplies a parallel example: A person was bitten by an animal, and ran to the river to wash out the poison from his wound. While at the river, he saw a child drowning. He jumped into the water and rescued the child. When the child thanked him, he responded, "Don't thank me, thank the animal that bit me. It was his bite that sent me to the river in the first place, so that I might be in a position to rescue you."

Rav Bergman rejects a "simple interpretation" of the Medrash. Rav Bergman finds it difficult to say that Moshe was telling Yisro's daughters that they owe thanks to the Egyptian who was beating up on the Jew. Rav Bergman quotes an alternate interpretation of the Medrash, in the name of his father-in-law (Rav Eliezer Shach), in the name of the Brisker Rav (Rav Velvel Soloveitchik).

When the Yeshiva in Lublin was to be built, a certain wealthy Jew, who had been very generous to the Yeshiva, was honored with placing the cornerstone at the dedication of the building. In its heyday, the Lubliner Yeshiva was one of the most elite and prestigious Torah institutions in the world. Thousands of people, representing the leadership of Polish Jewry and beyond, came to the historic event of the cornerstone laying for this Yeshiva's main building.

The Boyaner Rebbe approached the wealthy Jew who was honored with placing the cornerstone and told him: "I am not jealous of the me rit you have for laying the cornerstone. But I am jealous of the other action you must have done sometime in your life that brought you the merit of being able to lay the cornerstone." The first "merit," the Rebbe told him, was greater than the "merit" of laying the cornerstone. The "merit" of laying the cornerstone comes with publicity, an ego trip, and all kinds of trappings that take away from the reward of doing a simple mitzvah. But the original mitzvah that was done privately (b'tznius) without publicity and without crowds -– the mitzvah which triggered this second mitzvah (via the principle of mitzvah goreres mitzvah) is indeed something to be jealous of.

Rav Bergman links the message of the Boyaner Rebbe to the Jew in Lublin with the message Moshe Rabbeinu gave the daughters of Yisro. Moshe said, in effect, "What allowed me to have the merit to be able to save you today? It was the merit I achieved by rescuing my Jewish brother from the hand of the Egyptian wh o was beating him. Today's salvation was in front of many people. It made me look heroic. On what basis did I deserve to gain such honor? It was the fact that when (I thought) no one was looking, I risked my life to save a Jew being beaten up by an Egyptian. My first mitzvah in tzniyus (privacy) provided the opportunity for me to do this second mitzvah b'farhesya [with great fanfare]." This is the interpretation of the words "An Egyptian man saved us", according to the Medrash, according to Rav Bergman.

This write-up was adapted from the hashkafa portion of Rabbi Yissocher Frand's Commuter Chavrusah Torah Tape series on the weekly Torah portion. The complete list of halachic topics covered in this series for Parshas Shmos are provided below:

Tape # 038 - Husbands at Childbirth
Tape # 081 - Cholov Yisroel: Necessary or Not in America?
Tape # 129 - Giving English Names
Tape # 176 - Shalosh Seudos in Shuls: Is There a Problem?
Tape # 222 - Disposal of Shaimos
Tape # 266 - The Laws and Customs of Chupah
Tape # 312 - The Do's and Don'ts of Naming Babies
Tape # 356 - Turning Offender Over to the Secular Authorities
Tape # 400 - Sh'nayim Mikra V'echad Targum
Tape # 444 - The Deaf Mute In Halacha
Tape # 488 - Marrying Cousins?
Tape # 532 - Learning On Shabbos -- A Good Idea?
Tape # 576 – Davening With Shoes
Tape # 620 – Kosher Cheese: What Is It?
Tape # 654 – The Woman Mohel; Laser Milah
Tape # 708 – Your Child as a Shabbos Goy?
Tape # 752 – Saving Your Life – How Far Must I Go?
Tape # 796 – English Names Revisited
Tape # 840 – Baby Naming – Whose Privilege, Father or Mother?
Tape # 884 - Sh’mos -- The Corrosive Effect of Non-Kosher Foods

Monday, December 24, 2007

Shmot

Rabino Kalman Packouz

GOOD MORNING! This week I would like to share with you a true story. A few years ago a young man in Scotland, whom we will call George, is shaving in front of his mirror on a Sunday morn. The radio broadcast carries an evangelical minister booming questions: "Look around you, do you like what you see? Do you know what your life is about? Where are you heading? Want the answers? Then read the Bible!"


The young man finds the questions probing and personally relevant. At a loss for answers, he turns to his minister regarding the suggestion to read the Bible. The minister gives him a standard Christian Bible which he starts to read. A few days later George returns to the minister with questions: "How come we don't observe the laws of Kashruth? Why don't we observe the laws of the Sabbath?" The minister responds, "Oh, you started with the 'Old Testament.' (Jews bridle at calling the Torah the 'Old Testament' because we believe it is The Testament never having been superseded, rescinded nor added to.) "Skip that and read the New Testament."
George asks, "But don't we believe the Old Testament is the Word of God? Then why don't we do it?" Since his minister did not give him a satisfactory answer, he begins a search to find a minister, priest or pastor who could answer his questions. After several frustrating weeks of failure in getting answers, George asks himself, "Who really believes the Old Testament is the Word of God and keeps it?" In desperation and as a last resort, he approaches an Orthodox rabbi.


Finding the answers intellectually satisfying, George continues on his spiritual quest which eventually leads him to Rabbi Noah Weinberg, the founder of Aish HaTorah, in Jerusalem. After about a year of private studying with Rabbi Weinberg and other rabbis, George decides that he wants to convert to Judaism. Rabbi Weinberg advises him that he owes it to his parents to discuss his decision with them first before pursuing conversion. So, George returns to Scotland.
After dinner, sitting in the parlor over a cup of tea, George says, "Dad, Mum, you know I have been studying Judaism. It is my desire and my decision to convert." His mother looks at his father, his father exchanges a knowing look with his mother, and then his mother speaks. "Son, there is something that your father and I have never told you. We both went through the Holocaust and we decided that if it were ever to happen again, it wouldn't happen to our child. You already are Jewish."


If truth is stranger than fiction, perhaps it is because it has a better author!
What a shock for George. What an even greater shock for his parents. And what an irony! They tried to protect him so that he would have physical life by withholding the one thing - his covenant with the Almighty to uphold the Torah - that put life into his life, made his life meaningful.


What is our lesson? We do well to nourish the bodies of our children and to protect them. What are we doing to feed their souls? What are we doing to flourish that connection to Torah and the Almighty? Just as we read books on nutrition for children, we need to read To Raise a Jewish Child by Rabbi Hayim Donin and To Kindle A Soul by Lawrence Keleman (available at your local Jewish bookstore, at http://www.judaicaenterprises.com or by calling toll-free to 877-758-3242).

Torah Portion of the Week


Shmot

This week's portion tells a story often repeated throughout history: The Jews become prominent and numerous. There arises a new king in Egypt "who did not know Joseph" (meaning he chose not to know Joseph or recognize any debt of gratitude). He proclaims slavery for the Jewish people "lest they may increase so much, that if there is war, they will join our enemies and fight against us, driving (us) from the land." (Anti-Semitism can thrive on any excuse; it need not be logical or real - check out our online seminar "Why the Jews?"
Moshe (Moses) is born and immediately hidden because of the decree to kill all male Jewish babies. Moses is saved by Pharaoh's daughter, grows up in the royal household, goes out to see the plight of his fellow Jews. He kills an Egyptian who was beating a Jew, escapes to Midian when the deed becomes known, becomes a shepherd, and then is commanded by God at the Burning Bush to "bring My people out of Egypt." Moses returns to Egypt, confronts Pharaoh who refuses to give permission for the Israelites to leave. And then God says, "Now you will begin to see what I will do to Pharaoh!"
* * *
Dvar Torahbased on Growth Through Torah by Rabbi Zelig Pliskin
The Torah states:
"And the daughter of Pharaoh came down to wash herself at the Nile, and her maidens walked along by the side of the Nile; and she saw the box (containing Moses) amongst the rushes. And she stretched out her arm and she took it." (Exodus 2:5)
What lesson is there for us to learned from her action?
Rashi, cites the Sages that Pharaoh's daughter's arm stretched out very long and she miraculously was able to save the infant Moses.
A number of communal activists were at a meeting which was headed by Rabbi Meir Shapiro, the Rosh Hayeshiva of Lublin. The topic of the meeting concerned saving people's lives. There were some people at the meeting who said, "What needs to be done is simply impossible. There is no way that we could possibly be successful."
Rabbi Shapiro cited the Sages who explained our verse that a miracle happened to enable Pharaoh's daughter 's arm to stretch so far as to reach Moshe and save him. The question arises, "Why did she stretch out her arm in the first place? Didn't she realize that it was impossible for her to reach Moshe?"
He replied that a person must always try to do everything he can to save someone. Even if you think that your efforts on behalf of others cannot possibly succeed, still make a sincere effort to try anyway. You will be surprised to find that you will frequently accomplish much more than you imagined. "This applies to us," said Rabbi Shapiro. "We must do everything we can even if we do not really believe that we will be successful. The Almighty often helps and the efforts put in prove to be fruitful."

CANDLE LIGHTING - December 28
Jerusalem 4:08Guatemala 5:24 - Hong Kong 5:30 - Honolulu 5:40J'Burg 6:44 – Porto Koah 3:39 - Los Angeles 4:33Melbourne 8:26 - Mexico City 5:40 - Miami 5:23New York 4:18 - Singapore 6:50 - Toronto 4:30


QUOTE OF THE WEEK:
It's nice to be important;it's more important to be nice.

Monday, December 17, 2007

Parashá Vayechi

Rabino Kalman Packouz
(Nosso querido assistente)

GOOD MORNING!


Ever wonder why you do not maintain a sense of happiness after finally obtaining a material goal? Mel Fisher, the Florida treasurer hunter who passed away, spent 14 years searching for the Atocha's sunken treasure and then found it! After the immediate joy, he felt depressed and ... immediately started another search. Why do we continue to strive to obtain more and more things in our life, but often don't find them satisfying? Below is an excerpt from Dearer Than Life -- Making Your Life More Meaningful shared with permission of its author, Rabbi Abraham J. Twerski, M.D. I think it gives some insight.

"Much of Western culture appears to consider happiness as the ultimate goal in life, and defines ideal happiness as freedom from all distress and enjoyment of all pleasures. This is certainly not the Torah concept, which considers human life to be mission-oriented, with every person having a reason for his existence and a specific assignment to complete on earth. If being content were all there is to seek in life, then endowing man with the capacity of intelligence was counterproductive. Cows in the pasture are undoubtedly far more content than sophisticated humans. Seeking meaning in merely being content hardly befits an intelligent person.

"In order for a person to have self-esteem and a feeling of value, life must have meaning. In fact, meaning and value are inseparable.

" 'Esteem' comes from the Latin word that means to evaluate or to appraise. Let us look at what is the basis of self-esteem and how we ascribe value to anything.

"If we look around at all the objects in our homes, we will find that with the exception of items that have sentimental value only, we value things for one of two reasons: aesthetic or functional. Thus, you may have a handsome grandfather clock whose mechanism has broken and cannot be repaired. You nonetheless keep the clock because it is an attractive piece of furniture and it beautifies your home. However, if your can opener broke, you would undoubtedly get rid of it, because it has no aesthetic value, and since it can no longer serve its purpose it has no value at all.

"Let us now apply these criteria to ourselves. There may be a few people who are so attractive that they can consider themselves ornamental, but most of us cannot really think of ourselves as having great aesthetic value. This leaves us only with function as a basis for value, and raises the question: Just what is our function? What purpose do we serve?

"While the hedonist may at least, temporarily, gratify his physical desires, can he really find purpose in being content? What can the hedonist do when the existential question of finding meaning and purpose in life intrudes itself into his consciousness? Too often his only recourse is to try and distract himself from such thinking, and not infrequently he may render himself oblivious to the tormenting feeling of worthlessness by numbing his mind with substance abuse." (end of excerpt)

So, if there is no ultimate meaning in comfort, how does one fill his life with real meaning? If one asks himself what is worth dying for he will have a better understanding of what is worth living for. Ultimately, it will be a spiritual goal -- to transform oneself from an earthy creature to a spiritual entity, to emulate the Almighty, to perfect the world, to do kindness. Rabbi Twerski's book explores the pieces of the puzzle and clarifies the path for making one's life more meaningful and more satisfying. It is available at your local Jewish bookstore, at judaicaenterprises.com or by calling toll-free to 877-758-3242



Torah Portion of the Week
Vayechi

The parsha, Torah portion, opens with Jacob on his deathbed 17 years after arriving in Egypt. Jacob blesses Joseph's two sons, Manasseh (Menashe) and Ephraim (to this day it is a tradition to bless our sons every Shabbat evening with the blessing, "May the Almighty make you like Ephraim and Manasseh" -- they grew up in the Diaspora amongst foreign influences and still remained devoted to the Torah. The Shabbat evening blessing for girls is "to be like Sarah, Rivka, Rachel and Leah.") He then individually blesses each of his sons. The blessings are prophetic and give reproof, where necessary.

A large retinue from Pharaoh's court accompanies the family to Hebron to bury Jacob in the Ma'arat Hamachpela, the burial cave purchased by Abraham. The Torah portion ends with the death of Joseph and his binding the Israelites to bring his remains with them for burial when they are redeemed from slavery and go to the land of Israel. Thus ends the book of Genesis!

* * *

Dvar Torah
based on Growth Through Torah by Rabbi Zelig Pliskin

Before Jacob's death, the Torah tells us,

"And Ya'akov (Jacob) called to his sons, and he said, 'Gather together and I will tell you what will befall you in the end of days' " (when the Jewish people will be redeemed from galus, exile) (Genesis 49:1).
What did Ya'akov mean when he used the phrase "Gather together"?

When Ya'akov told his sons to gather together he meant that they should have achdus , unity amongst themselves. Only when there is unity among the descendants of Ya'akov can there be redemption. If there is not yet unity, it is not yet time for redemption.

With this we can understand what Yosef's brothers meant when they said to him later on (Genesis 50:16-7) that before Ya'akov's death he requested that Yosef forgive them. No where in the Torah is it recorded that Ya'akov asked Yosef to forgive his brothers. However, the commentary of the Shaloh tells us that the answer can be seen in our verse where Ya'akov asks the brothers to "Gather together". Ya'akov was asking all of them, including Yosef, for unity and the deep love that comes from unity. Where there is love, there is forgiveness.

This is a crucial issue for our time. People are very different from one another in many ways. However, if all the descendants of Ya'akov realize how important it is to have achdus, this unity will bring about a love that transcends the specific complaints one person has against another.



CANDLE LIGHTING - December 21
(or go to http://www.aish.com/shabbat/candlelighting.asp)

Jerusalem 3:59
Guatemala 5:20 - Hong Kong 5:26 - Honolulu 5:36
J'Burg 6:41 – PORTO KOAH 3:35 - Los Angeles 4:29
Melbourne 8:24 - Mexico City 5:45 - Miami 5:18
New York 4:14 - Singapore 6:46 - Toronto 4:25




QUOTE OF THE WEEK:

Love people for what they are;
don't judge them for what they're not.

Sunday, December 16, 2007

Auschwitz-Birkenau


VEJA, Fevereiro de 1945

Tropas soviéticas libertam Auschwitz-Birkenau , maior campo de extermínio dos nazistas - Poucas centenas de prisioneiros sobrevivem, mas há sinais de massacre em larga escala - Atrocidades contra judeus abalam mundo

Crueldade impensável: crianças judias em foto achada no arquivo de Auschwitz-Birkenau


as escrituras sagradas da religião judaica, ensina-se que nada vale mais que a vida humana - tanto que, dos 613 mandamentos do judaísmo, 609 podem ser violados quando se trata de evitar um óbito. Ao judeu é não só permitido como também mandatório que os fundamentos de sua crença sejam ignorados se isso for necessário para salvar uma vida. A explicação está no Talmude, que lembra que todas as pessoas descendem de um só indivíduo; portanto, salvar uma vida equivale a redimir um mundo inteiro, e ceifar propositalmente uma vida, em qualquer circunstância e sob qualquer justificativa, é o mesmo que dizimar a humanidade inteira....
No curso das últimas semanas, um mundo já atônito pela agonia de cinco anos de guerra ouviu relatos que parecem indicar o desaparecimento da humanidade, pelo menos em sua concepção previamente conhecida. Não se atentou contra a vida de um indivíduo; buscou-se varrer um povo inteiro da face da terra. Os outros povos, entretanto, não impediram a barbárie; alguns, ensandecidos pela brutalidade impiedosa da guerra, até sancionaram a matança. Campanhas de extermínio coletivo não são episódio inédito nas páginas mais escuras do compêndio de crimes da raça humana. Mas como explicar a prática de uma mortandade em escala tão monstruosa, com ódio tão febril e, paradoxalmente, com tamanha frieza? E como sustentar que ainda somos civilizados se, apesar dos desesperados alertas de um povo com 4.000 anos de história, uma corja de assassinos com pouco mais de uma década de poder conseguiu materializar suas ambições mais insanas?

Os indícios se acumulavam sobre as mesas das autoridades ocidentais havia anos. Testemunhos inquietantes das atividades dos nazistas nos países ocupados eram cada vez mais freqüentes. Em 27 de janeiro de 1945, contudo, encontrou-se a prova inconteste em Oswiecim, sombrio vilarejo a cerca de 60 quilômetros de Cracóvia, no sul da Polônia. Por volta do meio-dia, quatro jovens soldados de um batalhão de cavalaria soviético caminharam cautelosamente por uma estrada que conduzia a um complexo de galpões e cabanas. Por meio do arame farpado, avistaram ao longe esqueletos vivos errando lentamente de lado a lado. Ponteando o terreno forrado de neve, viram pilhas indistinguíveis de coloração acinzentada. Quando chegaram mais perto, sufocaram-se de pavor. Estavam às portas de em Auschwitz-Birkenau, o campo da morte, o maior centro de extermínio nazista.

Apenas algumas centenas de prisioneiros ainda habitavam o amplo complexo, já abandonado pelos alemães - quando o ruído da artilharia soviética pareceu próximo demais, os nazistas bateram em retirada. Com difteria, febre escarlate e tifo, os sobreviventes foram largados à morte entre os amontoados de cadáveres putrefatos. Nos dias que precederam a chegada da tropa vermelha, conseguiram resistir de forma inexplicável ao frio e à fome. Alguns tentaram rasgar o arame e colher batatas nas cercanias do campo. Não conseguiram sequer romper os fios. Desorientados e fragilíssimos, os espectrais prisioneiros pareciam perguntar, com seus olhares vazios e distantes: aquele pesadelo impensável havia enfim terminado?

Máquina fria - Como se o chocante encontro com os sobreviventes não fosse o bastante para assombrar os recrutas, a abertura das portas dos galpões que ainda estavam de pé - só seis dos 35 que formavam o complexo - apresentou evidências ainda mais horripilantes das atividades praticadas ali. Um dos pavilhões escondia montanhas de artigos diversos: ternos, vestidos, trajes infantis, sapatos, malas, óculos, dentaduras. As etiquetas das roupas e selos das bagagens indicavam que os proprietários vinham de todas as partes da Europa. Uma rápida estimativa feita com a contagem das escovas de dente estocadas no galpão gelou a espinha dos soviéticos. Eram centenas de milhares de hóspedes. Mas onde estavam todos eles?

Os galpões que ficavam logo adiante abrigavam a indizível resposta. Sempre orgulhosos de suas proezas técnicas e da notável eficiência de seu maquinário, os alemães montaram em Auschwitz-Birkenau uma verdadeira fábrica da morte, em que seres humanos eram abatidos em escala industrial. Ao contrário dos outros massacres cometidos pelos povos bárbaros na História, a matança não ocorria no fervor do campo de batalha, na fúria da conquista de terras inimigas ou sob o fanatismo das investidas religiosas. A fria máquina de extermínio nazista tinha planejamento, organização, precisão e eficácia. Os germânicos arianos, a "raça superior" que salvaria o mundo, eliminavam e incineravam indivíduos indesejados como quem ateia fogo no lixo para se eximir do trabalho de despejá-lo.

De acordo com testemunhos dos prisioneiros resgatados, sobreviver no abatedouro polonês era a possibilidade mais rara entre os diversos destinos de quem chegava ao campo. Logo de cara, uma porção significativa das vítimas trazidas através da ferrovia que corta Auschwitz era condenada à morte de forma sumária. Nesta primeira triagem, separava-se quem era capaz de trabalhar dos que eram frágeis demais para produzir. Para o segundo grupo, era o fim. Tropas nazistas conduziam o contingente - na maioria mulheres, crianças e idosos - para uma ala mais afastada. Os carrascos anunciavam: era hora de tomar banho e se livrar dos piolhos contraídos na viagem nos vagões de carga. Não era. Espremidos em câmaras seladas, sem roupas, no escuro, eram fatalmente sufocados por uma nuvem letal de gás Zyklon B. Em instantes, todos mortos - sem sangue nas mãos, sem esforço braçal, sem chance de erro, como deve ser em toda indústria de qualidade. No passo seguinte, a faxina: gigantescos crematórios vizinhos às câmaras engoliam os cadáveres, cuspindo fumaça negra de forma quase ininterrupta.

Estrela amarela - Quem passava na triagem inicial e seguia na outra fila não sabia ao certo o que produzia aquela nuvem permanente que brotava das chaminés. De qualquer forma, não tinha muito tempo para tentar adivinhar - escravizados, os prisioneiros considerados saudáveis eram colocados em galpões e campos de trabalho para intermináveis turnos de duríssimas tarefas. Sob a ilusão da reconquista da liberdade, cumpriam suas funções e tornavam-se engrenagens da máquina bélica alemã - no portão principal, um letreiro de ferro prometia aos que chegavam: "Só o trabalho liberta". A promessa, é evidente, era mais uma trapaça nazista. Morrer na linha de produção ou na rotina de sadismo dos guardas alemães era, para quase todos, só questão de tempo. Os relatos de presos que escaparam são, por enquanto, extremamente escassos. Sabe-se que, em outubro do ano passado, um grupo de presos tentou promover um levante no campo. Mulheres que trabalhavam numa fábrica de armas próxima conseguiram levar materiais explosivos a Auschwitz. Um crematório foi parcialmente destruído, mas todos os 250 envolvidos na tentativa de resistência foram executados em poucos minutos.

Conforme informações obtidas pelo comando dos Aliados, cerca de 20.000 prisioneiros com maiores chances de sobrevivência para a prática de trabalho forçado foram transportados a outros campos semelhantes quando os soviéticos se aproximaram. Acovardados, os alemães não só fugiram como também tentaram eliminar todos os indícios do massacre, explodindo os crematórios e incendiando os registros que detalhavam a "produtividade" dos fornos. Deixaram para trás, no entanto, documentos e evidências que ajudam a esclarecer o que se passava ali. Já é possível saber, por exemplo, quais grupos "indesejados" eram eliminados: eslavos, ciganos, deficientes físicos e mentais, testemunhas de Jeová, dissidentes políticos, homens homossexuais. Todos eram identificados por triângulos coloridos costurados às roupas. O triângulo rosa identificava um homossexual; o vermelho, um opositor político. O grupo majoritário, porém, não era nenhum desses. Identificado por dois triângulos, compondo uma estrela de Davi de cor amarela, ele foi sem dúvida o alvo prioritário da fúria dos fornos nazistas: os judeus.

Odiada e perseguida de forma implacável por Adolf Hitler desde sua ascensão ao poder, em 1933, a comunidade judaica européia foi aniquilada. Algumas dezenas de milhares ainda conseguiram fugir para a Palestina antes da adoção da "solução final", no fim de 1941. Mas quem caiu nas garras de Hitler dificilmente escapou. Pior: Auschwitz-Birkenau é apenas uma das fábricas da morte. Sabe-se da existência de pelo menos mais dez campos, incluindo os de Sobibór, Treblinka, Ravensbruck, Buchenwald e Dachau - os três últimos, no próprio terriório alemão. Por enquanto é impossível saber quantos judeus ainda vivem no continente, mas algumas autoridades ocidentais estimam que seis entre cada dez judeus tenham sido eliminados. E quem sobrou para contar a história guarda cenas de horror inimaginável na lembrança.

Quando relatam as monstruosidades presenciadas nos campos da morte, os sobreviventes geralmente se recordam primeiro das crianças. Falam dos bebês arremessados vivos nos crematórios; dos moribundos corroídos pelas doenças injetadas pelo médico de Auschwitz, doutor Josef Mengele; dos concursos de arremessos de crianças judias entre os guardas da SS. Também falam das mulheres; as mais jovens, estupradas repetidamente antes de mortas, seus corpos usados como tochas humanas em fogueiras de mortos - a carne delas, constataram os guardas, queima mais rápido. Quando pergunta-se sobre as pilhas de corpos, as testemunhas lembram de ratazanas mordiscando os cadáveres; de prisioneiros ainda vivos lutando para se expelir de uma montanha de mortos; de mulheres grávidas abortando fetos. E do cheiro, dizem todos....
Nas escrituras sagradas da religião judaica, ensina-se que, consumada a morte, nada é mais importante do que respeitar o corpo sem vida. O cadáver jamais deve ser deixado sozinho - um shomerim, ou "guardião", permanece ao seu lado. Na preparação para o sepultamento, o corpo é cuidadosamente lavado e envolto num sudário modesto; o féretro jamais fica aberto, para que ninguém presencie a ausência de vida. O luto é profundo e prolongado. Ao judeu, porém, a morte é um processo natural - como a vida, é parte do plano de Deus para cada um. Morto, o judeu inicia uma nova vida, tem um novo mundo à sua frente. E todos os que viveram uma existência digna são recompensados....

Albert Camus


PONTO DE VISTA: Albert Camus VEJA, Fevereiro de 1945

Nos dois primeiros anos desta guerra, o franco-argelino Albert Camus dizia ser contra a resistência armada. Mas, em 1941, viu um amigo ser morto na ocupação alemã. Desde então, Camus segue de perto a revolta - e neste texto, escrito em meio à libertação de Paris, fala sobre o triunfo contra o nazismo.

Enquanto as balas da liberdade ainda assobiam através da cidade, os canhões da libertação adentram os portões de Paris entre gritos e flores. Na mais bela e quente das noites de agosto, as eternas estrelas sobre Paris se misturam aos rastros de balas, à fumaça dos incêndios, e aos foguetes coloridos de uma celebração em massa. Esta noite sem paralelos marca o fim de quatro anos de história monstruosa e de uma indescritível luta na qual a França entrou em sintonia com sua vergonha e sua ira.

Aqueles que jamais se desesperaram sobre si mesmos ou sobre seu país encontram sua recompensa sob esse céu. Esta noite vale um mundo inteiro; é a noite da verdade. Verdade sob armas e em ação, verdade sustentada pela força depois de tanto tempo de mãos vazias e sem proteção. Ela está por todos os lados nesta noite, quando as pessoas e os canhões retumbam simultaneamente. É a própria voz do povo e dos canhões; ela é a face exausta dos guerrilheiros de rua, triunfantes com suas cicatrizes e seu suor. Sim, é de fato a noite da verdade, da única verdade que importa, da verdade disposta a lutar e conquistar. ...
"O preço foi alto.
Ele tinha todo o
peso do sangue e a
terrível dureza das
prisões. Mas ele
tinha de ser pago."

Peso do sangue - Quatro anos atrás, os homens se levantaram entre as ruínas e o desespero e calmamente declararam que nada estava perdido. Disseram que precisávamos continuar adiante e que as forças do bem sempre superariam as forças do mal se estivéssemos dispostos a pagar o preço. Eles pagaram o preço. E, certamente, esse preço foi alto; ele tinha todo o peso do sangue e a terrível dureza das prisões. Muitos desses homens estão mortos, enquanto outros vêm vivendo por anos cercados por paredes sem janelas. Esse era o preço que tinha de ser pago. Mas esses mesmos homens, se pudessem, não nos culpariam por essa terrível e maravilhosa alegria que nos eleva e arrebata como uma maré alta.

Porque nossa alegria não quebra a confiança deles. Pelo contrário, ela os justifica e declara que eles estavam certos. Unidos no mesmo sofrimento por quatro anos, ainda estamos juntos na mesma excitação; conquistamos nossa solidariedade. E de repente estamos estupefatos de ver, durante esta noite deslumbrante, que, por quatro anos, nós jamais estivemos sozinhos. Vivemos os anos da fraternidade. ...
"Ninguém é capaz
de viver sempre
entre a violência.
A felicidade e a
afeição ainda terão
seu momento."

A paz prometida - Duros combates ainda estão pela frente. Mas a paz deve retornar a esse planeta despedaçado e aos corações torturados por todas as esperanças e memórias. Ninguém é capaz de viver sempre entre assassinatos e violência. A felicidade e a afeição terão sua hora. Mas essa paz não nos encontrará esquecidos. E, para alguns entre nós, as faces de nossos irmãos desfiguradas por balas e a grande irmandade viril dos últimos anos jamais nos abandonarão. Que os nossos camaradas mortos aproveitem por eles mesmos a paz que é prometida a nós durante essa noite de pintura, pois eles já conquistaram-na. Nossa luta será a deles.

Nada é dado aos homens, e o pouco que eles conquistam é pago com mortes injustas. Mas a grandeza do homem está em outro lugar. Está em sua decisão de ser mais forte que sua condição. E se sua condição é injusta, ele tem apenas uma forma de superar isso, que é ele mesmo ser justo. Nossa verdade nesta noite, que paira sobre nossas cabeças neste céu de agosto, é justamente o que consola os homens. E nossos corações estão em paz, assim como os corações de nossos camaradas mortos estão em paz, porque podemos dizer, enquanto a vitória retorna, sem qualquer espírito de vingança ou de rancor: "Fizemos o que foi necessário".

Albert Camus ,31 anos, é filósofo, jornalista e escritor. Nascido na Argélia, ele fundou o Théâtre du Travail e trabalhou em publicações como Paris-Soir. Por ter tuberculose, foi impedido de se alistar no Exército da França. Em 1943 tornou-se o editor do Combat, o jornal clandestino do grupo de resistência de mesmo nome.

O feminino que me envolve e alimenta


André-Moshe Pereira, Presidente Kehillah Or Ahayim,
Comunidade Judia do Porto Oriente


A Y. B. Abraham.
Ao meu Querido Mestre R. K., a Y.M.
A M.B. do Gerês.

Foste assim irmão R.T., sem avisar, com esse riso solar e essa alma pura de menino bom, até à Eternidade, junto de Gan Éden, até já, irmão.


A. “- Você acredita na sorte? - Acredito. Na sorte e no azar. - D-us existe, existe, disse Mottke. - E daí se existe? Fica lá sentado no sétimo Céu, os anjos todos elogiando-O com seus hinos, e Ele se importa tanto com a gente quanto com a geada do ano passado”. Isaac Bashevis Singer, Uma noite na casa dos pobres, Cia Letras, S.P., 2004

B. O trabalho de Bracha Bettinger cria campos simbólicos e sub-simbólicos o que dentro do território feminino ganha alguma visibilidade.
A renúncia matricial é vista como a criação de novas possibilidades subjectivas. Isto porque o desenho das concepções de Ettinger assenta na noção de renúncia de Deleuze e Guattari. A subjectividade e a ordem simbólica trabalham de mãos dadas. A introdução da Matriz é como um cavalo de Tróia entre o Phallus e o Símbolo e o mapa da “metramorfose” (Ettinger, 1993: 51). Poderemos lançar as hipóteses de uma certa consciência no espaço de fronteira condividida com o íntimo estranho e a conjunta co-emergência na diferença e se isso supõe a particular dimensão feminina da subjectividade.
A consciência destes estados alterna com o ser um, separado ou fundido (Ettinger, 1994: 41). A série de renúncias, permitem uma continuidade do tempo feminino, que ecoa na co-criação das matérias e dos ‘sistemas semióticos’ (ver em Deleuze e Guattari, 1987: 334). Descrevendo os mesmos conceitos de Ettinger a renúncia trabalha como produtora de novas subjectividades (o feminino diz sempre mais; diz sempre quando não diz: a Shekinah sefirótica é a sua máxima expressão) na sua arte criadora no qual o feminino é visto em termos de renúncia ou afastamento matricial. A renúncia matricial é vista como a produtora de possibilidades neo-subjectivas que fornecem a base de uma ética existencial no feminino. Esta ética permite um tempo no qual nem o futuro nem o passado são determinados pela subjectividade fálica. “ nós precisamos de expandir o conceito do simbólico para além da rede de significantes do discurso”. (Ettinger, 1995:18)
Compreender o conceito de Ettinger do matricial como uma espécie de renúncia – não como signo ou significante – que conta para a via na qual o matricial desterritorializa desde dentro os enquadramentos com os quais se sujeita. O matricial torna-se uma espécie de ‘cavalo de Tróia’. Entender o matricial como renúncia é também a via na qual o matricial trabalha criativamente a respeito do feminino – “ O filtro lacrimal matricial afecta os eventos trans-subjectivos fora de eliminação (Ettinger, 1967: 641). Reinventando o campo das nossas possibilidades subjectivas para que elas incluam os eventos trans-subjectivos não é uma tarefa fácil. Ora é aqui justamente que Bracha Ettinger nos desafia, não somente como teórica feminista, mas também como artista e psicanalista (Ettinger, 1997). As suas intervenções a respeito do feminino através destes três aspectos do seu trabalho não são facilmente separáveis. O que torna o trabalho de Ettinger particularmente importante em todas estas áreas é que não somente ela desenvolve o trabalho de crítica, mas ainda mais difícil o trabalho directamente conotado à ‘co-afectividade’ relacional e ao trans-subjectivo. O seu trabalho desenvolve um precipício propenso (1996:129) ou um espaço a que ela se refere como uma “zona transubjectiva” (1999:16), “subjectividade-como-encontro” ou “subjectividade alargada”(1996: 145,133). Crucial para isto é a criação dos conceitos de matrix e matramorphosis como temos referenciado nesta composição; Ettinger define estes termos cruciais e relacionados como seguem: “Matrix: como eu entendo ou interpreto: um espaço psíquico criativo na linha da fronteira; e o stratum matrixial da subjectivação revela a subjectividade como um encontro de elementos de co-emergência através da metramorphosis.” (1996:125) O seu trabalho teorético desenvolve consistentemente a via na qual os conceitos de matrix e metramorphosis relativos ao aspecto feminino da subjectividade e ao espaço feminino e ao processo na ordem simbólica aparecem. Embora muito do seu trabalho teorético esteja explícita e intensamente comprometido com a psicanálise freudiana e lacaniana ela não limita o seu trabalho à psicanálise. Ela escreve que “ A matrix…implica uma relação especial entre o eu e o estranho/Outro no nível cultural e sociológico, e não somente na psicanálise.” (1994:43-4). Na sua análise de ‘mobilização’ dos fenómenos sociais, Ettinger não só convenciona a teoria psicanalítica tradicional (que aqui evocamos como a de Freud e Lacan) mas está informada por uma cifra objectual e relacional de teóricos como J.-François Lyotard, Emmanuel Levinas e das ideias anti-edipianas Gilles Deleuze e Guattari , que se tornam arte.
A originalidade do olhar de Ettinger a respeito do tema anti-edipiano busca o caminho duma concepção da matrix como “uma impressão de vários traços do feminino da especificidade corporal no real (e também do feto) da sua passagem sub-simbólica para o simbólico” (1994:43). Esta passagem do feminino do sub-simbólico para o simbólico é um aspecto do trabalho das renúncias ou abandono da sua arte. A sua particular aproximação ou ajustamento sobrevém no visual.

Uma identidade judaica


BUSCA EM ESPIRAL POR UMA IDENTIDADE JUDAICA OU UMA JUDIA ASHKENAZI AUTOFÁGICA PERDIDA EM TERRAS LITERÁRIAS


Patrícia Chiganer Lilenbaum

A busca por uma visão crítica de um judaísmo diaspórico no Brasil passa por um constante trabalho de herança e de construção e desconstrução de identidade. Cíntia Moscovich, Moacyr Scliar e Samuel Rawet são escritores que revelam, de maneiras diferentes, uma postura autofágica com relação a o que herdar do legado judaico; as inquietações e questionamentos de suas literaturas revelam que a transformação é necessária para que exista um Judaísmo vivo. The search for a critical vision on the diasporic Judaism in Brazil relates to a constant work of inheriting and construction and deconstruction of identity. Cintia Moscovich, Moacyr Scliar e Samuel Rawet are writers who reveal in different ways an autophagic attitude towards what to inheriting from the Jewish legacy; the restlessness and doubts in their literatures show that change is necessary to keep Judaism alive.

Sinto no momento em que escrevo estas linhas como se estivesse na eminência de um grande e surpreendente acontecimento, uma descoberta de algo que sempre esteve presente, mas nunca expressado e transformado em palavras. É um movimento difícil o de descobrir enquanto se cria. Nas páginas de um caderninho amarelo-fosforescente – talvez para me iluminar – venho anotando há alguns meses fragmentos de idéias, tentando capturar súbitos caminhos, revelações. Vou anotando minhas indagações – responderei a elas em determinado momento? – e brinco de suscitar polêmicas, de colocar o dedo na ferida – mas a ferida é minha. O que torna a brincadeira muito séria.


Talvez seja por demais dramático falar em ferida. No entanto, é uma metáfora interessante: quando pensamos em feridas pensamos em pele, em corpo – algo concreto, pessoal, íntimo. As feridas simbólicas são um talhe sem marca física, e podem demorar muito mais tempo para cicatrizar. Às vezes feridas não são sanguinolentas – são apenas uma farpa, nos incomodam, insistentes, mas não são mortais. Podem ficar sob a superfície por toda a vida, mas indicam por leve protuberância sua existência discreta e incômoda. Podem fazer parte de nós. Podemos nos acostumar. Até que chega o dia que decidimos cutucá-la.

Cutucar significa perguntar, e quando fazemos isso tendemos a ter mais perguntas do que respostas. Academicamente, somos levados a fechar perguntas, dar-lhes uma resposta ao menos temporária, ainda que não satisfatória. Pessoalmente, no entanto, as perguntas continuam a incomodar, instigar, e é a busca por suas respostas que nos mantém conscientes de nossos limites, que nos mantém humildes, enfim: vivos e abertos ao conhecimento.

Esperamos o Messias, esperamos as respostas; enquanto nem um nem outro chega (chegarão um dia?), temos todo o tempo e tormento para viver as perguntas, a espera, a busca. Já disse Walter Benjamin que não há Messias enviado do céu, mas sim que o Messias somos nós: cada geração possui uma parcela de poder messiânico e deve se esforçar por exercê-lo.

Isto é um misto (a rima casual inapropriada para trabalhos acadêmicos) de confissão acadêmica e pessoal, uma busca por caminhos a serem seguidos, que não estão tão claros e bem sinalizados, o que o torna uma espécie de work in progress. Talvez alguém chamasse a atenção para o fato de que uma confissão já traz em seu próprio conceito um caráter pessoal, e que ser ela acadêmica ao mesmo tempo é uma impropriedade, pois o que é acadêmico é público, profissional, separado da ordem pessoal. Separamos nossas vidas em áreas tão bem seccionadas que nos tornamos às vezes incapazes de enxergar as conexões, as causas e conseqüências. Separamos para melhor organizar e entender, e acabamos por impedir a verdadeira compreensão total de nossas escolhas, posições e ações.

Escrevo essas linhas no final de 2005, em meio a indagações sobre como dar prosseguimento à minha pesquisa de doutorado. No início do ano, entrei no programa de doutorado em literatura brasileira da PUC com a intenção de estudar Moacyr Scliar e Isaac Bashevis Singer. De certa forma, era um prosseguimento da lógica comparativa aplicada no mestrado, quando estudei Guimarães Rosa e James Joyce, dois autores de minha preferência que se colocavam como um desafio. Autores de uma envergadura que assustava – e o objetivo era justamente tirar a aura de inatingíveis que ambos carregam. Todavia, no caso de Scliar e Singer, o objetivo não se extinguia como literário e acadêmico, ou como fruto de uma admiração de leitora. Não era uma escolha que indicava apenas o evidente: ser eu amante da literatura, paixão já concretizada com graduação, mestrado e milhares de horas livres gastas me embrenhando em sebos, bibliotecas, livrarias, lendo e sonhando com o que ler. Dessa vez, o motivo mais evidente da minha escolha era ser eu judia. Posso dizer que, se Scliar e Singer não fossem judeus, não me interessariam no momento como objeto de pesquisa.

Assim, embutida na minha escolha de autores, havia a intenção primeira de estudar literatura judaica. Ou literatura escrita por autores judeus, já que o termo literatura judaica é de difícil definição. Literatura que trouxesse explicitamente temas judaicos, ou que implicitamente me revelasse uma visão de mundo que eu reconhecesse como judaica. Ou literatura que não abrisse qualquer porta ao universo judaico, mas escrita por um judeu, o que me permitiria perscrutar, procurar minúcias, reminiscências – repentinamente, o elemento judaico se impôs e norteou minha escolha.

Unir literatura e judaísmo foi uma novidade em minha trajetória. A literatura, que sempre esteve no limiar do pessoal e do acadêmico, recebia agora a adição de um fator até então exclusivamente pessoal. A literatura agora era dominada por um fator marcadamente meu, com o qual teria que arcar de maneira acadêmica – isenta? – transformando-o num objeto de estudo. E eis que percebo que isso não é tão simples como eu imaginava: estudar autores judeus significa um acerto de contas com a minha própria identidade judaica. A busca não é apenas acadêmica, profissional, intelectual – é também, e profundamente, pessoal e emocional.

A isso se soma uma contradição: participando de um programa de literatura brasileira, por que me direciono à literatura judaica, que carrega um estigma de marginal, estrangeira? Seriam as duas literaturas excludentes?

Provavelmente não, tal qual faz parte de minha identidade ser judia e brasileira. Estou num espaço entre fronteiras, um entre-espaço, e é este espaço dúbio, dentro e fora ao mesmo tempo, que constitui meu solo de enunciação. Trata-se, como bem sintetiza o título do livro de Moacyr Scliar e Márcio Souza, de um espaço Entre Moisés e Macunaíma. E, como está inscrito no próprio nome de Moacyr Scliar, é uma ponte entre dois mundos: Moacyr, nome essencialmente brasileiro, oriundo do romance Iracema de José de Alencar; Scliar, sobrenome estrangeiro, estranho aos ouvidos; unidos, formam um terceiro elemento, receptáculo de heranças mescladas.

É curioso pensar na constelação de nomes que me vêm à mente quando penso em literatura escrita por judeus – chama-la-ei assim primeiramente, de maneira ampla – ou em obras da área de Humanas que foram de pensadores judeus. Franz Kafka, Sigmund Freud, Walter Benjamin, Primo Levi, Eli Wiesel, Elias Canetti, Scholem Aleichem, Philip Roth, Jacques Derrida, Amós Oz – um grupo heterogêneo quanto a país, língua, mas com o elemento judaico presente. Lembro-me das minhas idas à biblioteca do colégio, e das primeiras leituras de Kafka, A Metamorfose, O Processo, Cartas ao Pai. Meu fascínio pela literatura de Kafka se fortalecia com o fato de saber ser ele judeu, embora sua literatura seja aparentemente ausente de elementos judaicos. Era um orgulho esquisito, um regozijo por pertencer ao mesmo povo que Kafka. O mesmo acontecia com as obras completas de Freud que minha mãe, psicóloga, adquirira, e que me olhavam de altas estantes – eu podia não saber ao certo do que tratava Freud, cuja obra só comecei a estudar na Faculdade, mas sabia que ele também era do mesmo povo. Clarice Lispector foi outra surpresa – também judia, ainda que velada.

Anos se passaram, e fiquei mais crítica e consciente com relação às questões da identidade, do poder, da cultura, mas curiosamente continuo com esse mesmo regozijo – como se esses nomes me integrassem num mundo íntimo e extraordinário, como se o brilhantismo desses homens de alguma forma me tocasse e me fosse transmitido – algo emocional e nada racional. Algo que me faz criar um elo entre a menina da foto que fica sobre a minha mesa – uma foto minha aos cinco anos, com o cabelo coberto por um lenço, as mãos estendidas sobre duas velas do dia de Shabat, o sétimo dia, do descanso, murmurando a reza em hebraico – e todo o universo da cultura judaica. Kafka, Freud e também a menininha da foto fazem parte do povo do livro. Que eu durante um bom tempo pensasse ser esse livro qualquer livro, como um símbolo de conhecimento, e não a Torá especificamente, não invalidava meu sentimento de pertencimento. E ainda prefiro a referência genérica a livros em geral do que a um especificamente.

Povo do livro ou Povo de Deus – termos que definem os judeus, sendo que o último é um constante alvo de crítica; objetivamente analisado, realmente exclui outros povos. Povo. Uma idéia que desde a infância nos é transmitida: não seríamos uma religião, mas um grupo mais complexo, que possui outros atributos além do de ordem teológico. Não pretendo colocar essa idéia por terra, apesar de reconhecer que é passível de desconstrução, uma desconstrução talvez até necessária.

Povo é um conceito de difícil definição, imbuído de certo orgulho, mas que traz a noção de unidade para um grupo diversificado e espalhado pelos quatro cantos do mundo. Falar de povo é falar de nação, de um grupo que se apreende como um conjunto já edificado e unificado, por costumes, língua, território. São homens que se mobilizam para e em nome da História: não há povo sem tradição.

No caso dos judeus, o conceito de povo é de aplicação irresistível, apesar de discutível. A unidade de língua não é uma realidade. O hebraico permaneceu como língua litúrgica até a criação do Estado de Israel em 1948, e passou por várias transformações para voltar a ser uma língua viva, cotidiana, do século XX. O local geográfico é menos ainda uma referência. Desde que os judeus vivenciaram sua segunda e irreversível diáspora, em 70. D.C., que os dotou de feições variadas ao redor do globo, a unidade territorial findou e nunca mais foi retomada. A partilha da Palestina fundou um Estado judeu, mas a representatividade judaica é tão ou mais legítima fora de Israel do que no Oriente Médio atualmente. Se há dois mil anos já havia uma grande diversidade de correntes judaicas – como mostra de maneira bem humorada o filme do grupo britânico Monty Python, A Vida de Brian – após a dispersão a diversidade não é apenas religiosa. Não há uma definição única de o que é ser judeu no século XXI.

De fato, é difícil para um judeu ashkenazi (da Europa) enxergar suas semelhanças com um judeu sefaradi (oriundo da Península Ibéria, e regiões da África), e é ainda mais difícil que os dois se identifiquem com os judeus negros, os Falashas, uma tribo que ficou isolada na Etiópia até o início de 1980, quando foi montada uma gigantesca operação para levá-la a Israel. A essência do judaísmo é difícil de ser definida, mas está ligada fortemente à idéia de origem comum, ainda que essa já diste de alguns milênios. Ao se falar em povo, as diferenças parecem convergir para uma confortadora idéia de pertencimento a uma macrounidade, que superaria a diáspora. Ao se falar de povo, estamos estranhamente negando o produto da diáspora, a diversidade irreversível.

A diáspora judaica traz um senso de tristeza, punição, negatividade. Como se a dispersão e conseqüente diversidade fossem uma ameaça à sobrevivência do Judaísmo. Como se apenas em Israel pudéssemos ser verdadeiramente judeus – e de fato há entre as mitzvot (os mandamentos judaicos) várias que só são realizáveis na terra de Israel. Essa idéia liga a identidade judaica a uma essência única, atemporal e principalmente religiosa. Porém, para muito judeus que se consideram como tais, a esfera religiosa passa ao largo do seu senso de pertencimento ao Judaísmo. Ser judeu parece carregar uma essência para além da religião.

Moacyr Scliar considera que a busca da identidade é algo inato ao ser humano. Ao falar da identidade judaica, ele considera que existem três maneiras de ser considerar judeu. A primeira é pelo viés religioso: ser judeu seria ser membro de certa religião, com determinado ritual, templo e mentor religioso – o rabino. Uma religião definida e estruturada, apesar de não apresentar a hierarquia da Igreja Católica. Uma religião que possui várias correntes: ortodoxos, conservadores, liberais. O segundo modo de ser judeu, que se afirmou no final do século XIX e chegou ao auge em 1948, com a formação do Estado de Israel, é a identidade sionista, ou seja, a parcela que diz respeito à aspiração milenar do povo judeu pela volta à terra prometida (o que traz também um lado religioso, mostrando que não é simples separar estanques as identidades), cuja concretização máxima seria a aliá (em hebraico, elevação), ou seja, morar em Israel definitivamente, fazendo o movimento de volta à origem.

Há quem não seja religioso, mas não pode desprezar o papel da religião em sua vida. Há quem, além disso, não seja sionista, mas nem por isso não se emocione ao tocar o Muro das Lamentações em Jerusalém ou ao entrar em bunkers na Colina de Golan, da época da Guerra de Yom Kippur de 1973, como aconteceu comigo em janeiro de 2004. Ser judia, para mim, não se fundamenta na religião e no desejo de aliá, o que não quer dizer que esses não exerçam um papel em minha vida.

O psicanalista Renato Mezan, ao empreender – como também já o fez, por outro ângulo, o historiador Yerushalmi – o estudo das relações entre a Psicanálise e o Judaísmo, acabou por analisar a carta de uma ex-aluna, que lhe escreveu em meio a dúvidas sobre como manter sua identidade judaica na passagem do ambiente fechado da escola judaica para a universidade e suas infinitas possibilidades. Lembro de ler a carta e a resposta de Mezan, e de ter sentido que se tratava de uma carta endereçada a mim. Ao falar de como muitos lidam com a sua identidade judaica, Mezan desnudou o fato de que sentimos culpa por não mantermos a tradição, mas de mesmo assim querermos manter essa indefinida identidade judaica que muitas vezes se apresenta para nós em aspectos mais superficiais em nossas vidas, algo como um perfume, um aroma que nos traz o conforto afetivo do pertencimento. Usar um cordão com uma Magen David (estrela de david) ou um hamsa (uma mão que simbolizaria proteção) como pingentes, ou colocar uma mezuzá (um fragmento da Torá que traria proteção ao lar) na porta de casa, ou gostar do gefilte fish (um bolinho de peixe adocicado) preparado pela avó, ou gostar de ler autores judeus...aspectos superficiais, sob certo ponto de vista, porém essenciais. E assim chegamos à terceira identidade judaica que Scliar identificou: a identidade cultural.

Ser um judeu cultural é ser o judeu menos definido, pois ser religioso implica em seguir rituais, em ir à sinagoga; ser sionista implica em se engajar, ir para Israel – os religiosos e os sionistas têm algo definido para fazer, atividades que os caracterizam e afirmam sua identidade. O judeu cultural não possui esses comprometimentos. Ele aprecia a História, o pensamento, a arte, tudo o que foi criado sob o signo do Judaísmo, embora suas ações não tragam sinais marcados. Na verdade há um comprometimento, mas esse está longe de ser objetivo.

Por me considerar uma judia cultural, sempre questionei muitos aspectos da vivência do Judaísmo. Figuras eminentes da comunidade judaica mundial, como o Rabino Steinsaltz, vêem como extremamente negativa, para a continuidade do Judaísmo, a identidade judaica que é somente de base cultural. O que é compreensível, visto que o século XX assistiu a uma vertiginosa queda numérica de judeus, em grande parte fruto do genocídio nazista, o Holocausto, a Shoah, um evento-limite, catastrófico. Após a Shoah, ser um judeu virou sinônimo de ser um sobrevivente, com um compromisso ético de levar avante a História de um povo quase dizimado. Porém, levar avante essa História requer a consciência de que é uma História múltipla, e que a tradição judaica será sempre modificada, e que isso não coloca em risco sua sobrevivência – antes a funda. A destruição catastrófica que a Shoah representou é absurda e incompreensível, é um pesadelo da História e uma pulverização em cinzas de um modo de ser e pensar – uma destruição fatal, extremamente negativa. Porém, o que restou não está a salvo de uma outra espécie de destruição, em outro nível. Um legado, para ser herdado, deve em parte ser destruído.

Essa idéia aparentemente assustadora, a tiro das minhas leituras de Jacques Derrida – também um judeu. O Judaísmo – seja a religião, a história, a cultura – não pode ficar intacto, não deve. O que não muda e não atinge uma nova forma permanece como um espectro, uma figura do passado que ainda não atingiu o futuro, e assombra o presente. Evidentemente não podemos ignorar os espectros. Devemos enfrentá-los, vê-los como aliados, conjurá-los. O primeiro passo para se aproximar de um espectro é o trabalho de luto: houve a morte, mas resta a herança. E herdar é uma tarefa, é um trabalho. Só herdamos o que somos capazes de herdar. Não recebemos passivamente um legado, tal qual tivéssemos nosso nome em um testamento: o ato de herdar implica em escolher certos aspectos em detrimento de outros. Uma herança deixa de ser um arquivo e passa a ser matéria viva na medida em que a filtramos, peneiramos, escolhemos. O legado herdado é reafirmado pela escolha – nunca é possível herdar tudo. O judaísmo se manterá vivo enquanto formos capazes de herdar dessa forma.

É preciso uma nova postura: considerar a diáspora não como uma queima de arquivo, mas como um multiplicador de espectros, de possibilidades, de maneiras de ser judaicas. Unificar acaba por ser uma ameaça ao mecanismo de sobrevivência do Judaísmo. A Shoah – uma queima de arquivo bárbara, para além do poder de representação da linguagem – significou a destruição do antigo universo judaico europeu, e houve uma perda irreversível do legado a ser herdado – porém, o legado restante, ainda assim, não será integralmente herdado. Como disse Isaac Singer, não é mais possível voltar completamente ao Shtetl (as aldeias judaicas que existiam no leste Europeu, em que a vivência judaica ficava isolada e preservada); é preciso criar algo entre o Shtetl e a civilização atual.

Criar esse algo é deveras complicado. Ao fundar minha identidade na cultura, e não na religião ou no sionismo, fundei um gosto por enxergar o caminho do questionamento como o único possível para manter o Judaísmo vivo. A idéia de que o Judaísmo é um conjunto de saberes, leis e atos a serem passados intactos de geração a geração não ecoa na minha vivência judaica. Embora pareça quase uma heresia, acredito que a sobrevivência passa pela transformação, que implica em destruição. E pensando na destruição como mecanismo de sobrevivência, e não como ameaça à sobrevivência, veio-me o termo autofagia.

Herdar significa trabalhar, fazer um esforço: escolher. E escolher implica em destruir. Autofagia (em que auto é próprio e fagia é comer), conceito da área da Biologia, em que uma célula ou tecido libera enzimas digestivas dentro de suas estruturas, que acabam por serem auto-digeridas, serve como metáfora para a necessidade de reciclagem, de se destruir para se preservar. A herança de um legado é autofágica: é preciso se devorar para sobreviver.

Dessa forma, defino minha identidade judaica como autofágica: sou judia na medida em que realizei um trabalho de herança, e que fui capaz de herdar, por hora – porque o trabalho de herança não finda, é constante, tal qual a construção da identidade – elementos como a Magen David, a hamsa, a mezuzá, o guefilte fish, algumas datas judaicas, como o Pessach e o Rosh Hashaná, o terror, a perplexidade e a curiosidade mórbida pela Shoah, bem como o senso de ser uma sobrevivente; algumas idas esporádicas à sinagoga no Shabat, várias lembranças emotivas de uma viagem a Israel, curiosidade sobre a História judaica, disposição infinita para debater sobre o conflito palestino-israelense... e uma fascinação por literatura escrita por judeus.

Assim, os caminhos da literatura me levaram novamente para meus questionamentos. Estudo autores judeus para estudar a mim mesma, como buscando encontrar neles esse elemento autofágico que me parece fundamental e que me define como judia. Ver em autores judeus modernos e não na Torá a chave para uma compreensão da minha identidade judaica já é um aspecto autofágico. Porém, desejo, além disso, descobrir em que medida esses autores rastreiam uma tradição perdida, um passado cristalizado, ou realizam a autofagia, a releitura e transformação desse grande legado judaico.

Ao tentar definir que autores judeus – sem ainda conseguir definir o que é um autor judeu ou o que é literatura judaica – que estudaria, li alguns escritores brasileiros de origem judaica – o já mencionado Moacyr Scliar, Clarice Lispector, Samuel Rawet, Bernardo Ajzenberg, Cíntia Moscovich. Encontrar o elemento autofágico me fez buscar a presença de uma crítica e de uma nova visão do Judaísmo, que arcasse com as perdas sem lamentá-las, mas considerando-as naturais e necessárias para a continuidade desse povo, dessa religião, dessa cultura.

Evidentemente, ao escolher estudar autores judeus, fui obrigada primeiramente a indagar: será que um judeu que se propõe a escrever será um escritor judeu? Essa é uma pergunta que atinge, novamente, o cerne da questão sempre trazida à baila, mas cuja resposta é sempre postergada, por ser sempre polêmica e cruel, porque excludente: o que é ser judeu? E quem define quem é judeu? Há princípios claros de definição ou princípios vagos que fazem parte de um mecanismo de poder?

Esse tipo de questionamento procede, mas me levaria a Foucault, e discutir a questão do poder é exaustivo e fora de meus objetivos. Ao considerar que ser judeu implica em uma das três identidades mencionadas por Scliar, esqueço-me de mencionar a legitimidade primordial, como nos é transmitida na tradição judaica: é judeu quem nasce de ventre judeu. Isso é um mecanismo de controle que determina a legitimidade de ser judeu pela origem. Porém, um escritor pode nascer de ventre judeu, mas sua literatura não ser judaica – mas será que isso realmente é possível? Ou em outras palavras: não há reminiscências?

Embora não possa traçar uma conexão reducionista entre vida e arte, tenho em mente que, como diz o poema Resíduo de Drummond, de tudo resta um pouco. Rubem Fonseca chama de síndrome de Zuckerman (personagem de Philip Roth) a terrível experiência que consiste em o público enxergar nos personagens o seu autor, como se uma obra sempre fosse autobiográfica. Esse terreno é movediço, mas não podemos negar que há, sim, alguma relação, nem que seja de total contraste. Clarice Lispector – outra autora que me trouxe aquele estranho orgulho de ser judia – era de uma família de imigrantes judeus, todavia não deixa traços explícitos judaicos em sua obra. Talvez o único seja o nome de Macabéia de A Hora da Estrela. Porém, o que há no nível do símbolo é sempre passível de pesquisa arqueológica e considerações. O silêncio também é uma presença. Ou um espectro.

Como judia, sempre tento enxergar algo judaico em autores judeus, e isso tanto pode ser um trunfo como uma limitação. Há sempre o risco de se guiar a interpretação para caminhos judaicos apenas. Ao ler O Centauro no Jardim, de Moacyr Scliar, enxerguei a figura do centauro judeu que acaba por operar suas patas de cavalo e se transformar num bípede, para melhor se integrar à sociedade, como um símbolo para a questão da identidade judaica, dúbia, marginal, estrangeira, sempre tendo que escolher entre que traços manter e que traços extinguir para se integrar na sociedade circundante. Porém, o centauro pode ser visto mais amplamente como o próprio sujeito cindido do mundo moderno, que se sente estrangeiro, excluído, sem a reconfortante sensação do pertencimento. Uma judia lendo um autor judeu é um constante repensar a leitura, uma constante vigilância sobre o seu próprio risco de etnocentrismo.

Nessa trajetória de estudo é difícil não se sentir entre dois mundos. Brasil e Judaísmo são colocados nos estudos sobre autores judeus como os dois mundos com os quais os escritores teriam que lidar. Mas Judaísmo e Brasil não são termos de natureza semelhante. O Brasil é um país, enquanto que o Judaísmo é uma religião/cultura, sem terra própria por dois milênios; mesmo a criação do Estado de Israel não reunificou a diáspora, e nem seria capaz, visto que para muitos judeus a questão do solo pátrio como fundador da identidade de povo foi se esmaecendo durante tantos séculos. O Brasil é um território concreto, em que um povo múltiplo se formou ao longo de cinco séculos, enquanto que o Judaísmo é território abstrato, que se desloca e se sobrepõe em muitos solos concretos. Esses dois elementos de peso diferente estão em relação e simbiose para formar o autor judeu da diáspora que escreve em português do Brasil, mesclando sua herança judaica selecionada e sua vivência como brasileiro.

Moacyr Scliar é o autor judeu-brasileiro por excelência, o mais representativo e publicamente conhecido, membro da Academia Brasileira de Letras, com uma extensa e diversificada produção. Ao mesmo tempo em que aparenta ser um narrador tradicional, Scliar se utiliza de elementos surreais e fantásticos com uma grande naturalidade, inserindo elementos e atmosferas inusitados com grande naturalidade. O já mencionado centauro de O Centauro no Jardim é apenas um elemento: no mesmo livro encontramos uma esfinge. Ao mesmo tempo, há um elemento muitas vezes político, de fundo marxista e messiânico, como em O Exército de um homem só, que nos remete ao mesmo tempo à realidade brasileira e ao contexto da Europa Central anterior à Segunda Guerra Mundial, em que uma geração de intelectuais judeus como Walter Benjamin e Georg Lukács desenvolviam um pensamento que misturava, sobre um fundo cultural neo-romântico, uma dimensão messiânica-judaica e outra utópica-libertária, que ia do marxismo ao anarquismo. Uma geração de sonhadores e utópicos, tal qual o capitão Birobidjan do livro de Scliar, que sonha um novo mundo.

O contraponto ideal a Scliar me pareceu Samuel Rawet, um escritor judeu mais à margem e como uma identidade judaica repleta de conflitos. Enquanto Scliar seria o escritor judeu orgulhoso de suas raízes, Rawet, ao longo da vida, desenvolveu uma relação tortuosa com sua identidade judaica, que chegou ao extremo auto-ódio. Ao contrário de Scliar, cuja prosa é sempre fluida, prazerosa, a escrita de Rawet é de difícil dicção, trabalhosa. Ler Rawet exige esforço, mas a tarefa árdua é compensada por sua visão da condição cindida do imigrante, da inadaptabilidade e da incomunicabilidade que podemos e devemos não limitar ao judeu, mas ao homem moderno. No que toca ao Judaísmo, Rawet é um autor fascinante, pois os elementos judaicos presentes vão variando ao longo da obra do escritor, até que a herança judaica passa da autofagia para uma radical destruição total da identidade judaica. Um escritor perturbador.

A esses dois escritores veio somar-se Cíntia Moscovich. Embora não me agrade utilizar o típico argumento do olhar feminino, é evidente que o fato de lidar com uma autora traz uma outra dimensão ao meu estudo. Há um olhar sobre o cotidiano da família judaica e as escolhas que são necessárias para habitar o mundo e herdar autofagicamente o legado ancestral. É um olhar humano, cálido, à primeira vista prosaico, que tira da simplicidade de instantes únicos, íntimos, a grande poesia da construção da identidade, como nos contos “Sheine Meidale”, “O telhado e o violinista”, ou no próprio depoimento da autora em “Bonita como a lua”, em que fala de sua infância, de seus sonhos de ser escritora e em que medida abriu mão de certas expectativas dos pais, imigrantes judeus, para escolher o que herdar. Ser médica ou advogada e casar com um bom rapaz judeu deram lugar ao trabalho como jornalista e escritora e ao casamento com um goi, um não-judeu.

Aproximo-me desses autores, leio-os, releio-os, insisto e encontro caminhos. Autores diferentes que unifico pelo Judaísmo, cujas possibilidades e nuances tento desvendar. Busco o Judaísmo possível, mutante, despido de sua majestade, e ao mesmo tempo confiro a ele cetro e coroa a cada instante. Típicos movimentos paradoxais de quando tentamos estudar um objeto do qual não temos distanciamento necessário. Nesse universo milenar e no meu universo que não chega a três décadas, sensações, desejos, informações e hipóteses movimentam-se e escrevem respostas. Ou mais perguntas. Patrícia Chiganer Lilenbaum é aluna do Doutorado em Literatura Brasileira na PUC-RJ, pesquisa escritores brasileiros cuja literatura expressa uma visão crítica sobre questões judaicas.


Referências

BOLLÈME. Geneviève. O povo por escrito. São Paulo: Martins Fontes, 1988. p. 13-39.
DERRIDA, Jacques. Espectros de Marx. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 1994.
______. Mal de Arquivo. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001.
“Entrevista com Moacyr Scliar”. Entrelivros. p. 20-5. Rio de Janeiro: Ediouro, ano I, n° 2, 2005
IGEL, Regina. Imigrantes judeus, escritores brasileiros. São Paulo: Perspectiva, 1997.
LISPECTOR, Clarice. A Hora da Estrela. Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.
LÖWY, Michael. Redenção e Utopia: o judaísmo libertário na Europa Central. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
MEZAN, Renato. Psicanálise, Judaísmo: Ressonâncias. Campinas: Escuta, 1986.
MOSCOVICH, Cíntia. Arquitetura do arco-íris. Rio de Janeiro: Record, 2004.
______. Duas Iguais. Rio de Janeiro: Record, 2004.
______. O reino das cebolas. Porto Alegre: L&PM, 2002.
RAWET, Samuel. Contos e Novelas Reunidos. Org. André Seffrin. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004.
SCLIAR, Moacyr. “A Identidade Judaica”. In: Tribunal da História: julgando as controvérsias da história judaica. Org. Saul Fuks. Rio de Janeiro: Relume Dumará/CHCJ, 2005.
______. O Centauro no Jardim. 10.ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.
______. O Exército de um Homem Só. Porto Alegre: L&PM, 2002.
______. e SOUZA, Márcio. Entre Moisés e Macunaíma: os judeus que descobriram o Brasil. Rio de Janeiro: Garamond, 2000.
STEINSALTZ, Adin. We Jews: Who are we and what should we do? San Francisco: Jossy Bass Ed., 2005.
VIEIRA, Nelson & GRIN, Mônica (org.). Experiência Cultural Judaica no Brasil: recepção, inclusão e ambivalência. Rio de Janeiro: Topbooks, 2004.
YERUSHALMI, Yosef Hayim. Zakhor. Rio de Janeiro: Imago, 1992.


Postagem: Andre-Moshe Pereira, Presidente Kehillah Or Ahayim

Thursday, December 13, 2007

Don't Rehash The Story of My Sale To Egypt


Rabino Yissocher Frand

When Yosef sent his brothers back to Canaan to deliver the message to Yaakov that his long lost son was still alive and well in Egypt, Yosef instructed them: "Do not quarrel on the road" (al tirgazu b'derech) [Bereshis 45:24]. Rashi, quoting Chazal, interprets the words "al tirgazu b'derech" to mean: "do not engage in halachic discussion, so that the trip does not become a source of agitation for you."
This instruction, as interpreted by Chazal, would seem to contradict a well known and explicit Biblical pasuk referring to words of Torah: "You shall teach them to your children and speak of them when you dwell at home and WHEN YOU WALK ON THE ROAD, when you retire and when you arise." [From the first paragraph of Krias Shma – Devorim 6:7].
The simple and most likely correct resolution of this contradiction is that it all depends what type of learning one is engaged in. To listen to Torah tapes while traveling on the road is certainly permissible. However, getting involved in complex and demanding analysis of complicated Talmudic passages should be avoided lest one become distracted from his travels and have an accident.
However, I recently saw a homiletic interpretation in the sefer Pri Tevua:
There is never anything wrong with discussing Daf Yomi or the weekly Torah portion while traveling on the road. On the contrary, it is appropriate to have such discussions. However, in this case, Yosef was steering his brothers away from having discussion about one particular halacha. He did not want them to start re-analyzing the appropriateness of their actions regarding his sale.
When the brothers originally sold Yosef, they arrived at that course of action following extensive discussion and after having concluded that their actions were legally appropriate (halacha l'ma'aseh)! They convened a Beis Din [Jewish Court] and they ruled concerning Yosef that he had the status of a "pursuer" (rodef) who must be put awa y before he does them mortal harm.
The Torah teaches that following the incident where they threw Yosef into the pit, "they sat and ate bread" [Bereshis 37:25]. What is the import of this statement?
Our Sages tell us that when a Jewish Court deliberates on life or death matters, they must fast. They must remain fasting until they arrive at a final decision on the matter. The above referenced pasuk [verse] teaches that the brothers convened a Beis Din to decide Yosef's fate. They fasted all the while they were deliberating. It was only after they arrived at a conclusion and executed their judgment that they sat down to break their fast and have a meal of bread.
Now the brothers were reunited with Yosef in Egypt in one of the most dramatic and compelling scenes in the entire Torah when Yosef identified himself to his brothers. Yosef asked if his father is still alive. Yosef cried. The brothers cried. The brothers now saw that they were wrong. They saw that Yosef was not a rodef, but was interested in their well-being all along.In such a situation, normal people -– 10 brothers who collectively made such a terrible mistake –- would likely start looking for scapegoats. Yosef could see all too well that as soon as they got on the road, the brothers would start pointing fingers at one another: "It was your fault!" "You're the one that said this!" "You're the one who said that!" He foresaw a great controversy amongst them all over again.
He therefore instructed them: "Don't get involved in matters of THIS halacha!" Don't review the whole matter of whether based on halacha you were right or you were wrong in throwing me into the pit or in selling me!
Yosef knew that Divine Providence (Hashgacha Pratis) directed the events as they unfolded. It would be fruitless for the brothers to try to assign blame to one another for merely being agents in carrying out the Divine Plan. Don't point fingers. It was nobody's fau lt here. The whole sequence of events is enveloped in mystery. Such mysteries are not to be understood by man. Don't dwell on this and do not even discuss it on the way back home!
The Beis Yisrael, the Gerer Rebbe, writes that this interpretation fits in well with Rashi's famous comment on the words "And [Yaakov] saw the wagons that Yosef sent to transport him, then the spirit of their father Yaakov was revived." [Bereshis 45:27]. Rashi explains that the wagons (agalos) were a coded message to Yaakov that Yosef remembered that when they were last together, they studied the laws of the Decapitated Calf (Eglah Arufa).
What coded message Rashi is referring to? The essence of the chapter of Eglah Arufa is the unsolved mystery (lo noda). It is not known who is responsible for the murder victim found on the road. The facts are simply not known. Yosef sent his father this very message: What happened to me is a mystery. That is why he instructed his brothers not to sta rt arguing with one another about who was right and who was wrong. Lo Noda. The rationale remains unknown. For some reason, this is the way G-d wanted it to happen and this is how it did happen. The brothers should not feel responsible for what they did. Therefore, he told them: "don't rehash it and don't regurgitate it."

G-d Did Not Want Yaakov To Remain In Canaan
The Torah says: "So Israel set out with all that he had and he came to Beer-Sheva where he slaughtered sacrifices to the G-d of his father, Yitzchak.
G-d spoke to Israel in night visions and He said, 'Yaakov, Yaakov' and he responded 'Here I am.' And He said 'I am the G-d – G-d of your father. Do not be afraid of descending to Egypt, for I shall establish you there as a great nation.'" [Bereshis 46:1-3]
There is an interesting Medrash on this passage:
Rabbi Yehoshua ben Levi says: I have inquired of all the masters of Agadah in the south to explain this pasuk to me. "Why does the pasuk mention specifically that he is slaughtering sacrifices to the "G-d of his father Yitzchak" and not mention the "G-d of his father Avraham" or the "G-d of his fathers" in general?" No one could give me an answer. But when I came to the Rabbis of the Galilee and to Rabbi Yochanan in Teverya they answered me that a person must honor his father more than his gran dfather.
The Medrash remains difficult. We understand that it would be inappropriate to bring a sacrifice only to the "G-d of his grandfather Avraham". But what would have been so wrong if it mentioned that he brought sacrifices to both the G-d of his father Yitzchak AND to the G-d of his grandfather, Avraham?
The following interpretation basically appears in the Sforno, but it is elaborated upon in the book Kometz HaMincha from Rav Chanoch Ehrentroy.
Yaakov Avinu is told that he should come down to Egypt because there was a famine in Canaan. Yaakov thinks to himself: This has happened in my family before. There was a famine previously in the days of my grandfather Avraham and he went down to Egypt. There was another famine in the days of my father Yitzchak and he did not go down to Egypt. He debated – what should I do? Should I do as my grandfather did and go down to Egypt or should I do as my father did and remain in Canaan?
He concluded that th e best plan would be to go down to Beer Sheva where Yitzchak had built an altar. "I will go there and offer a sacrifice and try to be inspired to act as my father acted because I am more duty-bound to show honor and emulate the ways of my father than I am duty bound to show honor and emulate the ways of my grandfather."
That is why he brought a sacrifice to the "G-d of his father Yitzchak." This is what the Medrash means: "a person is more obliged to honor his father than his grandfather."
It is in light of this interpretation that we can now fully understand the import of the third pasuk in the above quoted passage: "'I am the G-d – G-d of your father." I am the One who told Yitzchak not to go down to Egypt. But to you I say: "Do not fear to go down to Egypt, for I will make you into a great nation there."
The Sforno explains the difference between why G-d did not want Yitzchak to go down to Egypt and why He wanted Yaakov to go down to Egypt: "If your c hildren remain in Canaan, they will marry Canaanite daughters and become assimilated with them. In Egypt, this will not happen because the Egyptians detest the Hebrews –- they cannot even eat bread with them" (due to the fact that the gods of the Egyptians were sheep and the children of Yaakov were shepherds). Since the Egyptians would not break bread with them and would not socialize with them, they would not intermarry.
We see the extraordinary wisdom of Chazal from this idea. Our Sages prohibited Pas Akum [eating Gentile bread] lest it lead to intermarriage. Eating leads to socialization and socialization leads to intermarriage. If the eating is restricted, the socialization will be restricted and ultimately intermarriage and assimilation will be restricted as well.
In Egypt, where the Jews were an anathema to the population, they would not intermarry, but they would become a great nation. That is why, despite what G-d commanded Yaakov's father Yitzchak, G-d commanded Yaakov to go down to Egypt.