Saturday, February 16, 2008

O que vale a razão?

Andre Moshe Pereira
( Presidente Kehillah Or Ahayim )

A Sr. Mordechai Medina, a Y. Kerem, a Ernestina P. Veríssimo, a Y. Moran, a David Nissim, a Shlomo Elijah e Déborah Elijah.

O Talmude tem uma influência notável dentro do judaísmo.
Pode e deve ser estudado nas academias rabínicas, nas ieshivot assim como em universidades. A questão fundamental é como conferir vida à palavra escrita. O valor maior o Talmude é a sua transcendência universal. Se o Talmude estivesse ligado ao próprio meio acabaria por perder relevo.
Dentro do Judaísmo o Talmude tem um papel deflagrador apesar de um tanto discreto ou camuflado. O Talmude recebe influências múltiplas como gregas, persas, egípcias, babilónicas e romanas. Este intercâmbio acentuou-se com o tempo e houve mesmo permutas culturais.
Como poderiam os judeus viver no mundo sem obediência às leis civis locais? O Talmude permite isso. O casamento é um dos casos. Em Israel só existe casamento religioso, por isso talmúdico.
Os restaurantes e a gastronomia obedecem às determinações do Cashrut (normas dietéticas rituais) que por sua vez estão submetidas ao Talmude.
Nos meios de comunicação social os rabinos falam constantemente sobre parábolas, ditados e outros ensinamentos talmúdicos. Muitas lições são feitas na forma de esclarecimento judeu sobre a regularidade dos procedimentos estabelecidos pela lei se acordo portanto com a Halachah.
Ora para a interpretação ilustrada deste conjunto de preceitos exige-se um complexo modelo de integração universitária, religiosa, filosófica que por sua vez forma um gigantesco corpo interpretativo, teológico e uma jurisprudência fremente.
O talmude não é um livro mágico. A magia é uma solução de mãos vazias. As narrativas de factos maravilhosos não significam de forma alguma solução ou encantamento. A problemática mais que a solução é uma forma talmúdica. Lembremo-nos do relato que é feito pelo Professor Zeev Falk, da Universidade de Tel Aviv dos sábios Eliézer e Iehoshua onde se observa o uso alegórico na sua função racional.
Eliézer pediu que os muros da academia testemunhassem em seu favor. Iehoshua disse que os muros não deveriam interferir. Conta-se que os muros apenas se inclinaram, respeitando Eliézer; sem tombar, reverência a Iehoshua. As águas a seguir. As águas do ribeiro interromperam o seu fluxo quando Eliézer pediu o seu testemunho e logo Ieoshua bradou desconfiança em provas fantásticas.
Neste contexto, entre as provas racionais e fantásticas o que deveria prevalecer? Eliézer apelou a uma última instância a seu favor. Adonai. O rabino voltou-se para Adonai. Os Céus confirmaram o seu ponto de vista mas Ieoshua sentenciou com prova inabalável que conhecer e ensinar era algo delegado aos Filhos do primeiro homem e da primeira mulher. Ou seja, desde o Gan Éden. Segundo H. Sobel, CIP-SP o Rabino Joseph Soloveitchik decreta que “o homem haláchico não anseia por um mundo transcendente, por níveis celestiais de uma existência pura e primordial, pois não foi o mundo ideal – o mais profundo desejo do homem haláchico – criado somente com o propósito de ser realizado no nosso mundo real?” É assim que aprendemos que neste mundo tem sentido a Halachah. “ è aqui, neste mundo, que o homem haláchico adquire a vida eterna” E segundo o Rav Iaakov que cita o Pirkê Avoth o Capítulo dos Pais: vale mais uma hora de arrependimento e boas acções neste mundo que toda a vida do mundo porvir. Assim, no Talmude, vivem os homens. A Eternidade é assim o presente.
Daí que para os mais tradicionalistas o dever essencial é o estudo da Lei (Torah) tanto a escrita como as Lei Oral, o Talmude, transmitidas por Mosheh Rabeinu no Sinai. Ora como foi dito anteriormente o talmude está exposto a múltiplos tipos de leituras, tipos de investigação riqueza de temas, originalidade das perspectivas. Por exemplo E. Levinas (E.L.) sem deixar nunca de lado a sua observância judaica coloca o Talmude na mais elevada e depurada especulação filosófica e ética contemporâneas. Ieshaiahu Leibovitz desenvolve através de Levinas e na relação do Judaísmo deste ao pensamento ocidental uma relação sem desvanecimento ou substituição simbólica. O judaísmo aí entra como essência; não prevalece o ateísmo e a ocidentalidade de um Bernard Henri Lévy, ou Claude Levi-Staruss ou Ernest Cassirer, mas a notação funda de um israelita voltado para a filosofia. A expressão filosófica e fenomenológica do Talmud-Torah. Em Ética e Infinito (Ed. 70, Lisboa, Trad. Artur Morão) releva que “os textos dos grandes filósofos com o lugar que a interpretação tem na sua leitura, parecem-me mais próximos da Bíblia do que opostos a ela, ainda que a concretização dos temas bíblicos não se reflectisse imediatamente nas páginas filosóficas. Mas não tinha a impressão quando principiante da matéria, de que a filosofia era essencialmente ateia, e hoje também não penso assim. E se, em filosofia, o versículo não pode substituir a prova, o Deus do versículo, apesar de todas as metáforas antropomórficas do texto, pode permanecer a medida do Espírito para o filósofo”. Lembremos, por exemplo a Evolução Criadora de H. Bergson ou a noção de Espírito em WFHegel; pois mesmo o Talmude, segundo E.L. vive do seu não-dogmatismo, “ele vive de discussões e de colóquios. O teólogo recebe aqui uma significação moral de notável universalidade onde se conhece a razão” (Quatre Lectures Talmudiques, Éds. Du Minuit, Paris). A luz da razão que, por ora, celebramos neste texto, pelos talmidim, hic et nunc.








*Presidente e Fundador da Kehillah Or Ahayim, Comunidade judia Or Ahayim, Porto, Filipa de Lencastre, Docente Universitário/ Investigador Universitário; Presidente (A-G) CCLI. Membro da Direcção – Fundador do CEIsrael; Veja esp.
http://kehillah-or-ahayim.blogspot.com/